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“Perna-de-sabiá”, a noninha!!!

Podia ter sido Nerso, Virso, Mirto, Varte, Jão, como qualquer outro moleque. Não, foi Waldir, como queria minha mãe que sempre teve preferência por nomes pouco comuns, na época, como os que escolheu para minhas irmãs: Odila, Zélia, Neide e Mirtes.

Waldir Bíscaro *

 

A maioria das pessoas que me conhece pensa que meu nome é apenas Waldir. Até meus oito anos, também eu só sabia desse nome. Ao me matricular na primeira escolinha da Dona Elvira, não precisei levar nenhum documento. Era só dizer nome e sobrenome e, pronto, estava matriculado. Foi minha primeira lição de anarquismo ou, pelo menos, de antiburocratismo. Valia a palavra.

Quando passei da escolinha – patrocinada pela Antártica e gratuita – e fui me matricular no Grupo Escolar, da Prefeitura, tive que levar a Certidão de Nascimento. Foi aí que fiquei sabendo que meu nome completo era: Antonio Waldir. Não gostei nada, por uma simples razão: na escolinha da dona Elvira, eu era sempre dos últimos nas tomadas de lição e, agora no grupo escolar, era dos primeiros. Muita sacanagem!

Aos onze anos ingressei no Seminário e então, praticamente, perdi meu nome. Apenas meu sobrenome era minha identificação: Biscaro, aliás: Senhor Biscaro. Era o tratamento obrigatório. Imaginem só, um fedelho ser chamado de “senhor”!

Já na Faculdade, era só chamado de Antonio pelos professores. Ainda hoje, quando alguém diz que quer falar com o “senhor Antonio”, já sei que é pessoa que não me conhece.

Nas empresas por onde passei, sempre fui tratado como Professor Waldir. Somente na Cosipa, onde havia certa inflação de “Waldir”, passei a ser chamado de Biscaro, como no seminário. Sem o “senhor”, claro.

Na minha infância e mesmo mais tarde não cheguei a conhecer nenhum “Waldir”. O “Antonio” havia entrado para dar nome de algum santo, uma vez que “Waldir” não correspondia a nenhum santo conhecido. Acontece que “Waldir” vem a ser corruptela de “Walter”, que, por sua vez é corruptela de “Gualter”. “São Gualter” existe, mas ninguém sabia.

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Não posso dizer que tive algum apelido, propriamente dito. Às vezes ainda sou chamado de Didi e de Vavá, só por alguns velhos amigos. Também recebi “codinomes” interessantes – no início dos anos sessenta, por conta de meu entusiasmo pela revolução cubana, alguns colegas passaram a me chamar: Che Biscaro. Mais tarde, em 68, durante as revoltas estudantis em Paris, alguns alunos da PUC me enquadraram: Waldir Le Rouge, talvez porque divulgasse Herbert Marcuse. De pequeno, ouvi alguém me chamando de “perna-de-sabiá”, por que seria?

E aí, será que gosto do meu nome?

Até meus sete ou oito anos, sentia certa vaidade em dizer meu nome. Era raro e sonoro. Conforme fui crescendo, me dei conta de que “Waldir” parecia nome mais adequado para criança e não me imaginava um adulto com tal nome e, muito menos, um escritor, conforme minhas pretensões. Não conhecia nenhum escritor ou intelectual chamado Waldir. Desde essa época, comecei a imaginar pseudônimos. Os primeiros “Waldir” com alguma projeção de que tomei conhecimento foram dois músicos: Valdir Calmon e Waldir Azevedo. Depois, os “Waldir” famosos foram sempre jogadores de futebol. Nada contra.

Hoje em dia, convivo melhor com meu nome. Apenas não assumi o “Antonio”. Tanto em meus escritos como em meu cartão de visita consta apenas: Waldir Biscaro. Já estou quase desistindo de criar pseudônimo que, aliás, já estava até escolhido – Anton Gualter – mas cansei dele. Afinal, quem tem de cuidar da importância do meu nome sou eu mesmo, punto i basta!

O fato mais hilário a respeito do meu nome aconteceu na minha infância.

Devia ter entre cinco e seis anos quando fui crismado, na Catedral de Ribeirão. O Bispo, D. Alberto, ao passar pelo corredor central, para dar o crisma, perguntou meu nome. Só falei: Waldir e aí ele me deu um tapão no rosto. Não chorei, fiquei é muito puto com o Bispo; achei que ele não tinha gostado nada do meu nome, mas e daí? Ele não tinha razão nenhuma pra me bater! Nem reparei que as outras crianças também haviam recebido o tapa, pra mim o Bispo tinha mesmo implicado era com meu nome.

Depois da cerimônia, reclamei pra minha mãe, ela devia dar parte do bispo na polícia. Ela então me explicou que o tapa fazia parte do ritual, igual para todas as crianças. Ta bão, mas que não gostei, não gostei.

Madona mia, como nome dá trabalho!

*Filósofo e psicólogo e ex-professor de Psicologia do Trabalho na PUC/SP.
E-mail: awbiscaro@uol.com.br

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