Paixão é um sintoma, sentimento ou transtorno capaz de provocar uma desordem psíquica, química, física ou espiritual, em todos os que compõem e, principalmente, decompõem esta apaixonante equação que sempre nos desampara da lógica e da razão. Paixão nos transmuta a um fantasioso universo paralelo, a realidade, onde, parte da nossa memória afetiva será substituída ou apagada. Não existem leis, opções ou escolha às paixões. Elas surgem numa esquina, na mesa de bar. Numa palavra solta, numa boca calada.
Alcides Freire Melo. Texto e Fotos *
Paixão é um sintoma, sentimento ou transtorno capaz de provocar uma desordem psíquica, química, física ou espiritual, em todos os que compõem e, principalmente, decompõem esta apaixonante equação que sempre nos desampara da lógica e da razão. Ficamos desnorteados e, acabamos sem os argumentos ou palavras que justifiquem os excessos, mais ainda, as ausências. Paixão nos transmuta a um fantasioso universo paralelo, a realidade, onde, parte da nossa memória afetiva será substituída ou apagada. Não existem leis, opções ou escolha às paixões. Elas surgem numa esquina, na mesa de bar. Numa palavra solta, numa boca calada.
Ainda jogava peladas nos campos de areia e puxava carrinhos feitos com latas de óleo vazia, construídos no quintal de casa, quando, impiedosamente fui “atingido e contaminado” pela magia da professora. Àquela idade é quase impossível resistir a tantas palavras. A água de colônia, misturada ao pó de giz, corpo, palavras e pernas fazia a fórmula fatal. A cadeira que sentava para assistir aulas, imediatamente saiu do final da fila e ocupou um lugar de destaque. O uniforme do colégio agora estava bem cuidado e os sapatos escovados, sempre brilhavam. As frequentes notas vermelhas começaram a azular. Eu não sabia me apaixonar… Ainda.
Meses depois, transportando um enorme vazio e nota zero na prova da primeira paixão, a cadeira voltou ao final da sala. Depois daquele dia, e com a ajuda do tempo, outro cordão jamais voltou a guiar o carrinho; somente os gols voltaram a aparecer nas peladas dos finais de tarde. Àquela época, o corpo e o coração ainda eram pequenos demais para tamanho impacto; não havia como suportar. Logo, os batimentos cardíacos e os tumultos corporais voltaram ao normal. Fim da primeira paixão. Ainda não aprendi a me apaixonar.
Foi assim quando dancei a valsa com a aluna mais bonita da sala; o pequeno e não tão forte coração não resistiu, mudou o ritmo, disparou, quietou-se. Esta, com toda certeza, era a descoberta de uma nova modalidade de paixão. Materializada, física, tinha um corpo, cheiro e sabor, falava de perto, sorria e abraçava. Muitos dias depois da festa, escondidos, os dois, claro, beijaram-se. Seria assim, a paixão!
Aos vinte e poucos anos, administramos com muitos equívocos ainda, as nossas desregradas vidas. Somente algumas vezes, bem raramente, o cérebro começa a ordenar a hora certa de liberar mais adrenalina na hora de atacar da ofensiva. Ser racional e encontrar o momento certo de recuar. Aos 23 anos aparece um “jogo”, o jogo da sedução. Por não prever os danos, a alma segue corroída por dois longos anos. Vira presa, por não saber fugir. Aos 25 anos de idade, ainda havia uma luta com a memória, não com os desejos. Descobre, agora, que os amanheceres, todos, não marcaram, não foram bons, não amanheceram. Não lembra mais qual o perfume, o que bebiam… Esqueceram-se as promessas, os sonhos. Passaram os desejos… Passaram. O mundo voltou a ficar grande, racional, possível. Não se aprende nada sobre paixão aos 23 anos.
Um dia, uma fotografia deixou outra vez o mundo irreparavelmente desorganizado, a visão turva, sentimentos e sentidos confusos, atentos, determinados. Pensei intimidades, histórias divididas, compartilhadas, criadas; pensei vazio, nada; pensei sexo. Com a ausência de muitas regras, esta paixão seria a fórmula única para transgredir a vida. Fórmula para nascer uma paixão!
Especializada em provocar desejos, sonhos, viagens e aventuras. A calmaria capaz de desregular o hipocampo desregulou também quase toda a memória recente e até as melhores das paixões, somadas em todos os tempos. Tantas foram apagadas, outras modificadas; a mesma, por necessidade de sobrevivência foi reordenada, agora foi entregue à vigilância do tempo. Nunca aprenderemos sobre paixão: elas são fluidas, acho.
* Alcides Freire Melo – Repórter fotográfico e cronista em diferentes periódicos. Colaborador do Portal do Envelhecimento. E-mail: alcidesfreiremelo@gmail.com