Muitos pacientes morrem de pneumonia devido a alimentos em seus pulmões decorrente da dificuldade para engolir. E, tudo isto, antecedido por uma sucessão de internações provocadas pela mesma dificuldade. É válido continuar vivendo por um período estendido de tempo em condições inóspitas e sem o mínimo de bem-estar? A quem estamos realmente preservando com a decisão de uma vida tão alongada e, ao mesmo tempo, fragilizada?
Isabella Bastos de Quadros *
A questão central abordada por Jessica Zitter é que o sistema de saúde nos EUA lida bem com as disfunções orgânicas propondo métodos invasivos que solucionam questões pontuais sem, entretanto, avaliar se a conduta traz efetivamente qualidade de vida ou não para o paciente. Infelizmente esta é uma reflexão pertinente também para o sistema de saúde brasileiro. É válido continuar vivendo por um período estendido de tempo em condições inóspitas e sem o mínimo de bem-estar? O que afinal dá sentido à vida? A quem estamos realmente preservando com a decisão de uma vida tão alongada e, ao mesmo tempo, fragilizada?
A autora ressalta que estes métodos não prolongam a vida do paciente mas intensificam o seu sofrimento: Um estômago cheio de calorias artificiais bombeado mecanicamente coloca pressão sobre um sistema digestivo já frágil, aumentando a chance de empurrar o conteúdo do estômago para dentro dos pulmões. Além disso, os tubos implantados cirurgicamente para alimentação enteral apresentam uma configuração de complicações tais como sangramentos e infecções que podem resultar em dor, internações, entre outros.
O artigo destaca um indivíduo passivo diante de métodos invasivos, incluindo a medicalização da comida, que priva a morte de alguns dos últimos prazeres remanescentes da experiência humana como o gosto, olfato, tato e conexão com os entes queridos.
A morte transformou-se em interdito em nossa cultura mas, em contrapartida, é a única certeza que possuímos desde que nascemos. E quem resolve esse abismo entre a esperança e a sua aceitação? Ao relatar um caso de um paciente que precisou ser entubado para se alimentar em fase terminal, Jessica se pergunta: “Será que a nossa necessidade de alimentar nossos entes queridos nos cega para o que é realmente melhor para eles?”. Este questionamento merece uma discussão mais aprofundada entre as equipes multidisciplinares nos hospitais, clínicas e instituições e ampliada para os familiares dos pacientes em fase terminal.
Necessitamos cada vez mais de uma visão não mais localizante, mas totalizante e dinâmica no que se refere à saúde e à vida diante de nós. O paciente que ali está é um indivíduo completo e concreto e precisa ser considerado como tal e não como um conjunto de órgãos e suas funções. E a morte precisa ser desmistificada e encarada como um destino comum para todos, sem contudo ser apressada (eutanásia) ou adiada (distanásia). Segundo Sêneca, “Viver é aprender a morrer”.
Referência
Zitter, Jessica Nutik. Food and the Dying Patient. Disponível Aqui. Acesso em 21/08/2014.
* Isabella Bastos de Quadros é psicóloga e mestre em Gerontologia pela PUC-SP. É sócia da Anagatu IDH em Programas de Pós Carreira e colaboradora do Portal do Envelhecimento. Email: isabellaquadros@hotmail.com