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O processo de envelhecimento a partir da convivência

A pessoa idosa que está inserida em atividades de convivência tem a oportunidade de experimentar o envelhecimento como ferramenta de transformação e olhar o mundo de uma ótica diferente.

Júlia Fernandes Pereira Campos (*)


O interesse pelo tema do envelhecimento surgiu a partir de uma oportunidade de trabalho em 2014 como psicóloga recém-formada. A atuação em duas instituições de longa permanência para idosos (ILPI’s) na cidade de Belo Horizonte me fez aprofundar os estudos pelos significados, desafios e novidades no processo do envelhecimento. Na prática, a função do psicólogo era o lugar de escuta, acolhimento e promoção de atividades geradoras da interação grupal, do compartilhamento de temas significativos ao envelhecimento e institucionalização de pessoas idosas, em sua maioria com elevados graus de dependência. Outro ponto também muito importante se referia ao acompanhamento familiar desde a tomada de decisão da institucionalização, o período adaptativo do idoso, até a manutenção da sua qualidade de vida no novo contexto de moradia.

Atualmente, atuo em São Paulo, em um Núcleo de Convivência de Idosos (NCI) caracterizado como um serviço da proteção social básica. Diferente do serviço na ILPI, o NCI atende pessoas idosas que, em sua maioria, são independentes, e possuem capacidade e possibilidade de se deslocarem até o serviço, porém em situação de vulnerabilidade e risco pessoal e social.

O trabalho do psicólogo, e de outros profissionais da assistência social, é focado no desenvolvimento de atividades que contribuem para o processo do envelhecimento saudável, desenvolvimento da autonomia e de sociabilidades, no fortalecimento de vínculos familiares, convívio comunitário e prevenção a situações de risco social.

As atividades são oferecidas através de oficinas com a finalidade de potencializar e qualificar a promoção da convivência entre os usuários e profissionais. Com uma grade de programações, propõe-se um objetivo específico para cada atividade ou oficina realizada, mas todas com a proposta comum de exercer o convívio social, integração, cooperação, a partir de estratégias em grupos e, consequentemente, promover superação das limitações físicas e manutenção da saúde corporal, atenção, memória e linguagem, a fim de garantir que a pessoa idosa continue se sentindo parte da sociedade.

Dentro do contexto de experiências profissionais me deparei, e ainda me deparo, com diversas situações que envolvem a heterogeneidade do envelhecer. Do ponto de vista teórico, faz-se importante compreender conceitos ligados ao processo do envelhecimento para uma abordagem segura do tema. Pela perspectiva de Carl Gustav Jung (1875-1961) a mudança nas relações e as novas abordagens sociais e de convivência se fazem importantes para a construção de uma velhice suficientemente segura. Ademais, compreender, valorizar e qualificar práticas que promovam a convivência e o fortalecimento de vínculos é fundamental ao longo do processo de envelhecimento.

Se considerarmos o envelhecimento como um processo psíquico, uma vez que nos deparamos com mudanças físicas, biológicas e também de pensamentos, onde surgem questionamentos, dúvidas e crises de valores, podemos encará-lo como novos problemas a serem resolvidos. E quando pensamos em problema, Jung adverte que o significado não precisa ter uma finalidade de solução, mas uma disposição em trabalhar sobre ele.

Jung afirma que os processos inconscientes fazem parte do todo que o indivíduo é, o que nos faz considerar sua importância e refletir sobre as mudanças possíveis do indivíduo em construção e processo. Na obra “O Eu e o Inconsciente”, se refere ao realizar-se de si mesmo, indicando que pode ser o momento em que o indivíduo pode finalmente ser impulsionado a realizar aspectos de seu potencial que até então eram negligenciados, ou não reconhecidos, e concretizar novas metas e planos.

Núcleo de Convivência de Idosos: projeto Samuel Rangel

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O equipamento reconhecido neste trabalho, através da prática em psicologia, é um dos 95 NCI´s do município de São Paulo, localizado no bairro de Pinheiros na região Oeste da cidade de São Paulo. O Projeto Samuel Rangel, dirigido pela organização social Associação Metodista de Ação Social de Pinheiros (AMAS Pinheiros) e conveniado com a Prefeitura Municipal de São Paulo, por meio de parceria com a Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS) atende 150 idosos do território em situação de isolamento e risco social em diversas atividades.

O projeto surge após a identificação de uma população idosa de grande vulnerabilidade social decorrente da diminuição de renda, fragilidade de vínculos afetivos, discriminação etária e deficiências físicas e psíquicas. Seu principal objetivo é estimular os participantes a aprofundarem o autoconhecimento, convivência social, a conscientização da condição de pessoa idosa e de direitos sociais, para que possam melhorar a qualidade de vida e exercer plenamente a cidadania, contribuindo para um processo de envelhecimento ativo, saudável e autônomo.

Na grade de atividades são oferecidas diversas oficinas: trabalhos manuais (tricô, crochê, pintura em tecido, artesanato, bordado, macramê e mosaico), coral, reeducação postural, tecnologias, comunicação e memória, passeios culturais e gastronômicos, eventos comemorativos, palestras, rodas de conversa e bazar, além de projetos em parceria com outras redes de apoio como saúde, fórum da categoria e campo de estágio de graduação em gerontologia.

A pessoa idosa que está inserida em atividades de convivência tem a oportunidade de experimentar o envelhecimento como ferramenta de transformação e olhar o mundo de uma ótica diferente. Esse retorno é expresso no depoimento e fala dos participantes em relação à experiência de escolha, da possibilidade de se redescobrirem em novas habilidades e abandonarem uma ligação excessiva e restrita com o passado, tendo como consequência uma melhor qualidade nas relações vividas.         

Leia o artigo na íntegra, na Revista Longeviver edição 11:
https://revistalongeviver.com.br/index.php/revistaportal/article/view/921/982

Referências
BRASIL. Concepção de convivência e fortalecimento de vínculos. Brasília: MDS, 2012.
JUNG, C. G. A natureza da psique. Obras completas de C.G. Jung. 2. Ed. Petrópolis: Vozes, 2000. V. 8.
JUNG, C. G. O Eu e o inconsciente. Obras completas de C. G. Jung. 21. Ed. Petrópolis: Vozes, 2008. V. VII/2.

(*) Júlia Fernandes Pereira Campos – Psicóloga pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (2013). Especialista em Psicogerontologia pela Universidade Paulista (2021). Atuação em serviço de proteção social básica para idosos no município de São Paulo, Instituição de Longa Permanência para Idosos e Centro de Atividades. E-mail: julia.fernandespr@yahoo.com.br

Foto destaque de Dimitri Dim/Pexels


https://www.youtube.com/watch?v=FRJHkYvUT2E
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