Por conta disto, a demografia é uma ciência que se acostumou com o crescimento e com uma estrutura etária jovem.
José Eustáquio Diniz Alves *
A pirâmide populacional tinha os grupos etários quinquenais inferiores maiores do que os imediatamente superiores. A estrutura etária jovem fazia com que as políticas públicas se preocupassem fundamentalmente com a expansão das suas metas quantitativas. Vale dizer: maior número de maternidades e pediatrias, mais escolas, mais moradias, mais empregos, mais estradas, mais consumo, etc.
Porém, desde que as taxas de fecundidade (número médio de filhos por mulher) começaram a cair, a estrutura etária da população começou a sofrer uma transformação, com a redução da sua base, um crescimento da população adulta (15-59 anos), num segundo momento, e um crescimento da população idosa (60 anos e mais), num momento posterior.
A pirâmide populacional brasileira de 1985 foi a última a manter o formato egípicio e foi neste ano que a coorte etária 0-4 anos apresentou o maior número absoluto de crianças de toda a história brasileira. Havia 18,5 milhões de crianças, representando 13,6% da população total, sendo 9,4 milhões de meninos e 9,1 milhões de meninas. A população brasileira era de 136 milhões de habitantes em 1985 e a partir desta data o número de crianças brasileiras começou a diminuir em termos absoluto e relativo.
O índice de envelhecimento (IE) mostrava uma estrutura etária jovem. Havia 50,4 milhões de crianças e jovens de 0 a 14 anos (representando 37% da população total) e 8,7 milhões de idosos de 60 anos e mais (representando 6,4% do total). Desta forma, o IE era de 17,2 idosos para cada 100 pessoas de 0-14 anos.
Todavia, nas décadas seguintes a base da pirâmide foi se reduzindo e o topo foi se alargando, em um processo que vai continuar no século XXI. As projeções demográficas da Divisão de População da ONU, na hipótese média das tendências da fecundidade, apontam um pico de 231 milhões de habitantes em 2055 e uma população total de 208 milhões de habitantes em 2085, sendo que a população de 0-4 anos deve ficar em 9,4 milhões (cerca da metade do número de crianças de 1985), sendo 4,8 milhões de meninos e 4,6 milhões de meninas.
O índice de envelhecimento deve passar para 272 idosos (78,6 milhões de pessoas de 60 anos e +) para cada 100 crianças e jovens de 0 a 14 anos de idade (28,9 milhões de pessoas). Os idosos vão representar 37,7% da população total no ano de 2085. A população brasileira de 0 a 60 anos de idade vai começar a declinar a partir de 2025 e o crescimento, no restante do século, vai ocorrer apenas na população idosa.
Desta forma, ao invés de planejar cada vez mais maternidades, escolas e empregos deverá haver o planejamento de uma situação com menos nascimentos, menos estudantes e menos trabalhadores entrando na força de trabalho. Mas uma das tarefas mais difíceis será lidar com o sistema de repartição simples da previdência social, pois este sistema pressupõe que haja um fluxo crescente de pessoas em idade de trabalhar para sustentar o fluxo crescente de pessoas idosas e em condições de inatividade econômica (não contribuintes da previdência).
Para manter o mesmo padrão de vida, o grupo de idosos precisa ser sustentado pelo grupo de adultos produtivos. Se estes últimos diminuírem, a única forma de manter o padrão de vida dos idosos é promovendo um grande aumento da produtividade do trabalho da população economicamente ativa e um bom aproveitamento do segundo bônus demográfico.
Todavia, a produtividade, em geral, depende da expansão da economia e da disponibilidade de recursos naturais, especialmente de energia extrassomática. Produzir mais com menos pode ficar cada vez mais difícil quando há uma população em declínio, uma carga maior de dependência provocada pelo envelhecimento da estrutura etária, uma escassez relativa de combustíveis fósseis e crescentes problemas ambientais.
Desta forma, a sociedade brasileira, na fase do envelhecimento e do decrescimento populacional, vai ter um grande desafio prático e teórico pela frente, pois terá que lidar com uma pirâmide populacional mais parecida com um retângulo. Isto vai dar o que pensar, especialmente nos métodos e objetivos das políticas públicas.
* Doutor em demografia e professor titular do mestrado em População, Território Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. Membro da rede de colaboradores do Portal do Envelhecimento. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br