Com mais de 100 anos de história, a Sociedade Esportiva Palmeiras, em São Paulo, começa a se conscientizar que precisa dar mais atenção aos seus sócios idosos.
Quando falamos em clube esportivo a ideia de vitalidade, muita atividade física e competitividade vem logo à nossa mente. Um clube com a idade do Palmeiras possui muitos sócios que em décadas passadas corriam, nadavam, patinavam, jogavam, faziam mil e uma atividades, mas hoje, idosos que são, não têm a mesma energia, vitalidade e disposição para usar o clube como outrora. Porém, não deixaram de ser sócios e gostam ainda mais de frequentar as dependências do clube, passar bons momentos ao lado de velhos amigos, papear, falar dos velhos e novos tempos enquanto tomam um café, um chá, almoçam ou jantam em uma de suas agradáveis lanchonetes ou restaurantes.
Como o Palmeiras se preparou para acolher esses sócios que envelheceram junto com o clube? Não se preparou. Mas ao se deparar com essa realidade, está aos poucos compreendendo a necessidade de se adaptar.
No início dos anos 2000, um grupo de associadas começou a se encontrar para realizar atividades em conjunto. Mas quando queriam estar sozinhas para conversar, o clube pouco colaborava, oferecia os lugares mais terríveis. Não conseguiam entender a importância daquele trabalho que passou a ser conhecido como Papoterapia.
O grupo não se deixou abater, não se desestimulou. Uma vez por semana, depois da hidro, da piscina, do banho de sol, da academia, da corrida, elas saíam em romaria em busca de um espaço que pudessem sentar e conversar. A regra continua a mesma até hoje: falamos sobre qualquer assunto que esteja nos afligindo, causando sofrimento, dor. Falamos um pouco de tudo, menos fofoca. E o que é tratado no grupo, no grupo fica, ou seja, as sócias mantém sigilo.
A professora Neide Gaudenci de Sá intuía que aqueles encontros estavam fazendo bem a todas, ao bem-estar físico e mental. Todas levavam a sério o compromisso e entendiam que se tratava de um espaço a ser conquistado, construído, inventado e reinventado.
Neide tomava a inciativa de preparar os encontros como fazia quando preparava aulas. Propor atividades. Criar dinâmicas. Introduzir um tema para debate. Superar dificuldades.
A resiliência do grupo fez com que o clube passasse a observá-lo com outros olhos. A ouvi-lo. Rampas de acesso, corrimãos, coisas simples foram sendo implementadas para facilitar a vida dessas associadas idosas. Conquistas.
Algumas pessoas perceberam com maior clareza o movimento das mulheres do Papoterapia.
Nesta nova fase do Palmeiras (novos prédios, novo estádio, novos espaços), a partir de 2008 o grupo foi contemplado com uma sala ampla e equipada para suas reuniões que ocorrem todas as quintas-feiras na parte da manhã. Se você é sócia, tiver 60 anos ou mais e quiser se juntar ao grupo, é só procurar o Departamento de Cultura e Arte e se encaixar.
Ah, outra coisa legal, enquanto conversam executam atividades manuais que ajudam na memória e cognição. A principal é o tricô, uma terapia a parte. Curtem a descontração do trabalho, a criatividade que transforma fios, novelos em arte. Casaquinhos, sapatinhos, cachecóis, tocas, tudo para ser doado a entidades como a Casa da Mãe Solteira.
Muita depressão já foi superada no grupo. Muitos traumas foram trabalhados e retrabalhados, afinal, ninguém chega aos 60/70/80 anos sem dores e sofrimentos. Separações, perdas de entes queridos, acidentes, golpes, violências, abusos, assaltos, sequestros, nada disso deve ser guardado, pois tentar ignorar o trauma é uma forma de alimentá-lo. O correto, está provado pela Ciência, é falar a respeito do fato, buscar acolhida, procurar compreender e aprender com o evento.
O clube que abre as portas aos seus associados idosos, acolhe, permite que tenham uma convivência saudável dentro de suas dependências, está sem dúvida à frente de seus adversários. O Palmeiras faz isso. Mas ainda é pouco. Pois na hora que dona Neide, voluntariamente, não puder mais preparar as atividades, o Papoterapia acabará e os membros remanescentes ficarão desamparados.
O Departamento de Cultura e Arte deveria ver com outros olhos esse programa, investir só um pouquinho nos sócios antigos, naqueles que viram o clube surgir e o ajudaram a crescer. Se em todas as faixas etárias existem atividades patrocinadas para os sócios, por que com o idoso é diferente? O que representaria para o clube o custo da contratação de um(a) profissional para assumir o papel de animador sociocultural? E por que não ampliar a turma, oferecer encontros em dias e horários diversificados, aproveitar a experiência acumulada e dar um passo a frente, ser vanguarda de fato e ganhar mais esse campeonato? O Palmeiras está muito próximo dessa conquista, o que não pode é deixá-la escapar no último minuto da prorrogação.
Vamos lá, Verdão!