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Mãos ao teclado!

Quando enviei pela primeira vez para alguns amigos – a maioria, ex-alunos – a crônica número um, que apelidei de “croniquinha”, expressei minha intenção de provocar neles a vontade de também escreverem suas memórias, seus causos, seus palpites, críticas e tudo mais que quisessem para trocarmos entre nós.

Waldir Bíscaro *

 

Acho que não fui suficientemente convincente para induzir essa troca e deixei de insistir. Tenho certeza, se tivesse insistido acabaria recebendo bom retorno. Nos retornos que recebi da última crônica, o que mais me chamou a atenção foi a quantidade de pessoas que se manifestaram a respeito de intenção de também escrever suas experiências e outros assuntos para trocarem com os amigos. Alguns expressaram alguma falta de habilidade, outros confessaram certa preguiça ou indisciplina, uma vez que tinham muito que contar e não se punham ao trabalho.

A habilidade de escrever se aprende escrevendo e, creio que o gênero literário mais adequado para quem quer começar a escrever é exatamente a crônica. Começa que ela é livre, livre de regras, livre de métricas e de injunções acadêmicas. Começa-se sempre por onde der pra começar e avança-se com a mesma liberdade de uma criança em um jardim, pode pisar na grama, pode colher flores e, se houver frutinhas, é só apanhá-las e comer. Para as questões de sintaxe e de ortografia, em geral, o próprio Word dá muito bem conta, mas não custa ter um “Aurelinho” de bolso, ao lado do teclado.

Claro, nem todo mundo teve a sorte de ter um bom professor de literatura e de estilos literários. Aos quatorze anos, eu tive essa sorte, estando ainda no seminário. Já contei em uma das primeiras crônicas que esse professor era linha dura e tinha, como norma máxima, a concisão.

Ele era fanático por Antoine Albalat, estilista e crítico literário francês que entronizara a concisão como a qualidade suprema da obra literária. Em nossas composições – lição de aula – não era permitido nada além de doze linhas. O único aluno que conseguia “optime” era o Carlos Franchi que veio a se tornar livre docente de Linguística, na Unicamp. O máximo que consegui foi um “bene” e olhe lá, tudo mais foi “mediócriter”. O bom de tudo isso é que me interessei por literatura e por ser um dia escritor.

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Escritor mesmo… não cheguei lá. O haver escrito um só livro não faz de ninguém um escritor e é por isso que me tornei apenas escrevinhador o que, aliás, é bem divertido.

Vamos agora deixar de papo furado e retomar o tema do início: por que não começar já a botar na tela nossas ideias? Hoje, todo mundo sabe o que é “livre associação”, pois é mais ou menos isso que ocorre na arte de escrever. É deixar a imaginação solta e os dedos lépidos. Comece, por exemplo, a escrever uma cartinha pra si mesmo, cobrando aquilo que um dia quis escrever e não teve ânimo suficiente pra começar. Nesse caso, seja firme consigo, cobre-se pra valer, xingue-se, ameace, mas, depois, dê boas risadas. É que ninguém merece autopunir-se e também não vai ser necessário.

Esse intento de começar a escrever pode servir como um teste de autodisciplina o que é uma coisa sempre desejável. Somente vim a tomar gosto por escrever temas livres aos setenta e um anos, quando participava da Oficina de Memória Autobiográfica, da Professora Vera Brandão, na PUC. Até então, só escrevera temas acadêmicos, profissionais, políticos, coisas cansativas. Na Oficina, predominavam obviamente temas de natureza autobiográfica, causos, personagens que compuseram o cenário de nossa vida além de algumas trombadas. No começo, apenas me lembrei de dois ou três casinhos, mas, conforme ia escrevendo, os casos e fatos como que pulavam na minha frente.

A matéria prima das crônicas é exatamente tudo isso: pequenos fatos, tipos humanos que vamos conhecendo, lembranças da infância, gafes e tropeços e, por que não?, nossas fragilidades…

São Paulo: Março 2013

* Filósofo e psicólogo e ex-professor de Psicologia do Trabalho na PUC/SP.

E-mail: awbiscaro@uol.com.br

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