Mais de 100 municípios do Nordeste não têm psicólogos e 70% não contam com psiquiatras - Portal do Envelhecimento e Longeviver
Ícone do site Portal do Envelhecimento e Longeviver

Mais de 100 municípios do Nordeste não têm psicólogos e 70% não contam com psiquiatras

Imagem de uma unidade do SUS

No Janeiro Branco, Maranhão é o estado com menos psicólogos na rede pública do Nordeste.



Por Thiago Aquino (*)

A campanha Janeiro Branco conscientiza sobre os cuidados com a saúde mental e incentiva a população a buscar ajuda, mas entidades alertam que o número de profissionais do SUS que atuam na área é insuficiente para a demanda da população. No Nordeste, o Maranhão tem o menor número de psiquiatras e psicólogos da rede pública da região: existe um psicólogo para cada 5,4 mil habitantes e um psiquiatra a cada 53,3 mil. 

Em contrapartida, Alagoas é o estado que possui maior quantidade proporcional de psicólogos da região: 1 a cada 2,4 mil habitantes.

Ainda de acordo com levantamento realizado pela Agência Tatu, em toda a região, 103 cidades não possuem psicólogos na rede pública e quase 1.300 não contam com o atendimento de psiquiatras.  

A apuração, feita a partir da base de dados do DataSUS, considerou os dados de novembro de 2024, os mais recentes enviados pelos municípios e disponibilizados na plataforma.

Psicólogos do SUS no Nordeste por 100 mil habitantes

A média regional é de um profissional para cada 3.978 pessoas. O cálculo leva em consideração a quantidade de profissionais que atuam no SUS e a quantidade de habitantes dos municípios, segundo o IBGE (2022). 

O estado do Maranhão tem 18,5 psicólogos a cada 100 mil habitantes, o que representa um profissional para cada 5.404 pessoas, o menor número entre os estados da região e o terceiro do Brasil. Na sequência estão os estados da Bahia e Ceará, com 22 e 22,3 psicólogos a cada 100 mil habitantes, respectivamente. 

No ranking do Nordeste, o estado de Alagoas é o que mais disponibiliza psicólogos na rede pública: são 41 por 100 mil habitantes, ou seja, 1 psicólogo para cada 2.432 pessoas. Apesar de ainda ter um número muito distante do ideal, segundo especialistas, é o segundo melhor cenário entre todos os estados do Brasil, ficando atrás apenas do Amapá. A média nacional é de 27,2 por 100 mil habitantes. 

Saúde mental nas capitais do Nordeste

No Nordeste, oito das nove capitais estão acima da média nacional, com exceção de Fortaleza. A capital do Ceará é, na região, a que menos conta com os profissionais de psicologia no SUS, sendo 26,2 por 100 mil habitantes. O município está em quinto lugar no ranking entre todas as capitais do país com menos psicólogos. Se toda população fosse atendida, seriam 3.818 cearenses para cada psicólogo. A reportagem tentou contato com o Município por meio dos telefones informados no site, mas não foi atendida.

Na contramão, Maceió é a capital do Brasil que mais disponibiliza os profissionais: 57 a cada 100 mil habitantes, ou seja, um psicólogo para cada 1.724 pessoas. Dos 546 psicólogos registrados no DataSUS, 352 estão disponíveis em equipamentos da rede municipal e 194 do governo estadual.

O que dizem os especialistas

O Conselho Federal de Psicologia (CFP) reconhece que há um baixo número de profissionais em Psicologia na saúde pública, embora seja o maior empregador para os profissionais. “O número de profissionais na saúde pública ainda é pequeno para o atendimento às demandas da população. Além disso, há uma distribuição desigual no número de profissionais por região do país”, afirma o conselheiro Jefferson Bernardes, professor do curso de Psicologia na Universidade Federal de Alagoas (Ufal).

Doutor em Psicologia Social, Jefferson alerta que nem mesmo a capital com o melhor cenário têm motivo para comemorar, porque além do baixo número de profissionais, falta um planejamento que priorize a promoção da saúde. 

“Maceió também é a capital no país com a menor cobertura populacional de Estratégia de Saúde da Família, 35,49%. Ou seja, onde estão os profissionais de Psicologia em Maceió? A maioria está em serviços ambulatoriais na atenção especializada e em hospitais gerais e não na atenção primária”, informa Jefferson. 

Um dos que sentem na pele essa realidade é o sushiman Pedro Silva*, morador da periferia de Maceió. Ele é paciente de uma psiquiatra em uma UBS do município e recebeu o encaminhamento para um psicólogo, no entanto ficou frustrado. 

“Sofro com ansiedade e a psiquiatra falou que preciso de um psicólogo para o meu caso, mas no posto só tem um e não tinha vaga. Isso foi em setembro, mas ainda em janeiro vou voltar para tentar de novo”, detalhou o maceioense.

A Secretaria de Saúde de Maceió informou à reportagem que o atendimento psicológico no SUS se inicia na Atenção Primária, por meio das Unidades de Saúde. Nas Unidades que possuem o profissional no quadro, o usuário pode realizar o agendamento de uma triagem no local mesmo para iniciar o tratamento. Já nas unidades que não possuem, é oferecido encaminhamento e informações de unidades de saúde onde possuem o atendimento. 

A reportagem citou a situação do paciente e a Secretaria de Saúde confirmou que há um psicólogo para adultos na unidade em questão, mas alegou que a UBS não teve conhecimento do caso do usuário. 

Não perca nenhuma notícia!

Receba cada matéria diretamente no seu e-mail assinando a newsletter diária!

Verifique sua caixa de entrada ou a pasta de spam para confirmar sua assinatura.

“Caso não existisse o profissional no local, as orientações seriam oferecidas ao solicitante e ele seria encaminhado para receber atendimento em outro equipamento de saúde”, disse a secretaria em nota, apesar do paciente afirmar que não recebeu nenhuma orientação.

70% dos municípios sem psiquiatras

Outro dado negativo é que 70,8% dos municípios não têm psiquiatras do Nordeste. Mesmo assim, a região apresenta a segunda melhor situação do país, ficando atrás apenas do Sudeste (65,4%). Em todo o país, apenas 28% dos municípios brasileiros têm, ao menos, um profissional. Os demais não têm cobertura psiquiátrica. 

O estado com pior índice é o Amazonas, que possui 0,6 psiquiatra para cada 100 mil habitantes, ou seja, é como se tivesse que dividir um profissional para essa quantidade de pessoas. 

No Nordeste, o Maranhão tem o pior índice também com relação a esse profissional. Os municípios contam com 1,8 profissional por 100 mil, o que significa um psiquiatra para cada 53.359 habitantes. A média nacional é de 3,2 por 100 mil habitantes. 

Da região, a Paraíba aparece com melhor índice, ficando em quarto lugar no ranking nacional: 4,1 para cada 100 mil habitantes. O estado fica atrás apenas de São Paulo (4,3), Distrito Federal (5,1) e Rio Grande do Sul (6,1).

“Atendimento não é luxo”, afirma Instituto Janeiro Branco

O Instituto Janeiro Branco, associação de promoção à saúde mental, avalia que há descaso histórico e subfinanciamento da saúde mental pública, como explica o presidente, o psicólogo Leonardo Abrahão.

“O número de psicólogos disponíveis no SUS é insuficiente para atender às demandas crescentes da população brasileira, o acesso a serviços especializados ainda é limitado. É urgente que o poder público reconheça que a presença de psicólogos não é um luxo, mas uma necessidade fundamental para a promoção da saúde e a prevenção de adoecimentos psíquicos”. 

Leonardo enfatiza que falta a ampliação de políticas públicas. “Urge a implementação de ações preventivas em larga escala, psicoeducação e atendimento psicossocial, dar suporte aos profissionais e fomentar uma rede integrada e humanizada de cuidados, com profissionais capacitados, valorizados e condições de vida digna a toda a população. Isso atuaria como fator de prevenção ao adoecimento mental e emocional”, pontua o psicólogo.

O CFP também chama atenção para a necessidade de um cuidado integral e contínuo. “Não há sentido em compartimentar uma campanha e avançarmos somente em um determinado momento pontual ou alguma situação extrema. Saúde mental é trabalho para o ano inteiro”, afirma o psicólogo e professor Jefferson Bernardes ao citar alguns empecilhos na rede pública. “são contratos temporários, frágeis que dependem do gestor do momento. Muda-se o gestor, mudam-se os profissionais. Parece tratar-se de forma velada de privatização das políticas de saúde”, lamenta o conselheiro. 

Psicólogos no SUS superam rede privada no Norte e Nordeste

Os dados do DataSUS revelam ainda que o Norte e o Nordeste são as regiões em que o número de psicólogos no SUS é superior aos profissionais que atendem na rede privada.  A região Norte tem 3.424 psicólogos disponíveis para atendimentos públicos e 1.540 na rede privada, uma diferença de 55%. Já o Nordeste tem 13.741 psicólogos pelo SUS, 45% a mais do número de profissionais que atendem particular, que somam 7.548. 

Quanto ao número de psiquiatras, em todo o país há mais profissionais na rede pública do que na iniciativa privada.

*A reportagem utilizou nome fictício para preservar a identidade do entrevistado

Dados abertos: A Agência Tatu preza pela transparência, por isso disponibiliza a base de dados e documentos utilizados na produção desta matéria para consulta: Psicólogos e psiquiatras no SUS

(*) Thiago Aquino é repórter de checagem de fatos freelancer. Jornalista formado pelo Centro Universitário Tirantes (Unit-AL). Ainda como estudante, ganhou prêmio com série de reportagens sobre o Rio Mundaú.

Fonte Agência Tatu: https://www.agenciatatu.com.br/author/aquino/. Foto: Itawi Albuquerque/Secom Maceió


Portal do Envelhecimento

Sair da versão mobile