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Mãe: de concreto, aço e seda

Descobri que as mães são uma fortaleza de concreto e aço, vestidas de uma seda que esvoaça ao vento. E sempre, quando necessário, usam esta seda para deitar, amar, beijar. Cobrir os filhos em todas as adversidades: frio, calor e desamparos. Escudo das intempéries da vida, enxugam as lágrimas. Rasgam felizes, pedaços para decorar as festas dos filhos.  Esta “seda” serve para anestesiar dores, ausências, derrotas. Acalmar delírios, celebrar.

 

Para ser verdadeiramente pai teremos que, de todas as maneiras, imaginarmos mãe e, assim, somente assim, conseguiremos aprender sobre abnegação, resistência, paixão e vida. E, sem muito ou quase nenhum esforço ou sacrifício, compreender e aceitar as várias formas de amar, aprender sobre preconceito e aceitação. Muito sobre perdão. Ainda travo uma luta, mesmo pequena, contra a natureza descolada do homem para um dia, quem sabe, ser mãe.

Não que falte a incondicionalidade ao amor e todos os sentimentos que entrego aos meus filhos, não faltam. Acho. Talvez por tanto perceber que, amor de mãe é diferente, passei a compreender que existem várias formas e maneiras de “amar” e de perceber o universo. É tarefa das mais árduas, difíceis mesmo, amar a maneira de uma mãe. Para isso é exigido um esforço físico descomunal, para saber antecipar o futuro sem deixar o passado distanciar-se, por exemplo, como elas fazem; sem precisar necessariamente, para esta “tarefa”, músculos fortes. Fundamental será ser mãe.

Busco a resiliência e a sabedoria para, feito mãe, aprender liberar uma energia parecida com a delas. Força única que elas reservam, guardam, sabe-se lá onde e, na forma de luz, amor, defesa usam para iluminar e sinalizar os caminhos dos filhos, ou dobram de intensidade para defendê-los, mesmo que falte para própria defesa física ou luz aos seus caminhos. Não adianta; só as mães são assim.

Precisamos desenvolver, crescer e aguçar todos os nossos sentidos para termos a capacidade de compreender, mesmo de longe, a dimensão, forma e estrutura de uma mãe. Não aprenderemos, nem jamais compreenderemos, se continuar vivo o totalitarismo do homem arrogante que transgride, bate, maltrata e assassina mães. Amparados sempre pelo “direito” de ser “homem”: macho. Para ser homem bastaria saber compreender a forma como uma mãe ama e, por um segundo, mensurar ou sentir o calor de suas lágrimas quando precisam “arrumar o quarto do filho que já morreu” (Chico Buarque). É da alma que saem as lágrimas e tudo que é gestado por elas.

Foi somente quando ganhei da Dona Fransquinha, minha mãe, um peito maravilhoso, cheio de leite, mãos que me acarinhavam, que descobri ser um privilegiado nesta nova vinda. Quando o leite acabava, cada vazio ia sendo preenchido de amor; era tanto por quatro filhos que eles continuam cheios, pleno de um amor que permanece vivo e próximo, bem próximo até hoje. Este não acaba nunca: é assim “amor de mãe”. Recebi ainda dela, carinho, compreensão, direito à liberdade em todos os sentidos.

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Descobri que as mães são uma fortaleza de concreto e aço, vestidas de uma seda que esvoaça ao vento. E sempre, quando necessário, usam esta seda para deitar, amar, beijar. Cobrir os filhos em todas as adversidades: frio, calor e desamparos. Escudo das intempéries da vida, enxugam as lágrimas. Rasgam felizes, pedaços para decorar as festas dos filhos. Também sem medo, mesmo negando a dor, retiram tiras e pedaços para atar as feridas dos filhos até estancar o sangue, mesmo do menor arranhão. Esta “seda” serve para anestesiar dores, ausências, derrotas. Acalmar delírios, celebrar.

O destino e a busca levaram-me a encontrar, e achar, uma das sedas mais leves e esvoaçantes que o vento poderia ondular. Aqueles dias, já cobria uma forte torre de concreto e aço desenhado de uma forma diferente, que parecia leve. Uma construção de forma escultural. A cada movimento que aquela seda fazia ao vento, mais aumentavam meus desejos, sonhos e delírios. Desejo de deitar sobre ela e, embrulhar-me àquela quase impalpável e única seda. Desejo de cheirar, abraçar e ouvir o silêncio que ela fazia aos ventos. Foi grande a magia quando olhei através dela e visualizei infinitas décadas, juntos.

Estavam assim ativados todos os meus cinco, seis, dez sentidos. Estava assim realizado o sonho e possibilidade de construir fortes edificações. Construímos juntos, Socorro e eu, uma chamada Isadora, outra, Rafael.

Amo as mães.

Fotos: Alcides Freire Melo. 

 

Alcides Freire Melo

Repórter fotográfico e cronista em diferentes periódicos. No Portal colabora com crônicas e fotos. Email: alcidesfreiremelo@gmail.com

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