Com nome de imperador romano, o Júlio César da Democracia Corinthiana foi campeão paulista em 1982 e 1983 e vestiu a camisa da seleção.
Quando falamos em Democracia Corinthiana, pensamos em Sócrates, Casagrande e Wladimir. Júlio César não era titular absoluto do Timão, mas quando entrava em campo levantava a torcida. Era um ponta veloz, driblador e gostar de fazer gol.
“Quando marcamos um gol, a alegria é tão grande e nos sentimos tão bem que achamos que podemos ser vitoriosos em tudo.”
Júlio César tem uma história fascinante (deve virar filme) que vale a pena ser contata e repetida milhões de vez.
Por excesso de cálcio no corpo, perdeu a audição aos 30 anos. Nesta época já havia se afastado dos gramados e trabalhava como representante comercial.
“Levei dois anos para admitir minha deficiência, para aceitar que estava surdo.”
Júlio César desenvolveu duas paixões na vida, o futebol e a música. Passava o dia correndo atrás de uma bola e a noite tocava violão. Sua história de superação teve início ainda no útero materno.
“O médico disse para minha mãe que ela não poderia ter mais um filho e marcou a data do aborto para 15 dias.”
Contrariando ordens médicas, a mãe de Júlio seguiu com a gestação. Submeteu-se a um tratamento com cálcio para suprir suas deficiências e, depois do nascimento, o garoto seguiu com o tratamento que no futuro provocaria sua surdez.
Tudo isso aconteceu em Viña Del Mar, no Chile, onde Júlio nasceu. Júlio não lembra do terremoto fortíssimo que assustou seus pais a ponto de retornarem para o Brasil. O pai contava, saudoso, sobre maus e bons momentos vividos no Chile. Especialmente o dia em que esteve no Estádio Nacional para assistir ao Brasil ser bicampeão mundial.
Foi treinar no Palmeiras. Conseguiu se firmar entre os garotos e, aos 14 anos, o Verdinho foi disputar um campeonato no Chile. Houve uma folga e o time fez uma excursão até Viña Del Mar. Quando o ônibus parou para a criançada admirar a paisagem, uma das mais belas do continente, Júlio caiu no choro. A molecada achava que ele chorava por saudade de casa, mas Júlio chorava pela sua casa, chorava por Viña Del Mar, o lugar onde nasceu.
Júlio trocou o Palmeiras pelo Corinthians de Casagrande, Wladimir e companhia. Estreou aos 17 anos. Estádio lotado. Deu conta do recado, fez parte da Democracia Corinthiana e sagrou-se campeão pelo Timão duas vezes.
Sua carreira de sucesso o levou para a Bélgica. Na Europa se conscientizou que precisa se preparar para quando parasse de jogar. Enquanto a maioria dos colegas fazia Educação Física, Júlio escolheu o curso mais difícil, neurolinguística na Faculdade de Bruxelas.
Retornou ao Brasil, jogou em times de outros Estados (Botafogo, Paysandu e Londrina) e encerrou a carreira em grande estilo, jogando pelo Brasil contra o Chile, seu país de origem, no Estádio Nacional.
O curso de neurolinguística abriu as portas de uma multinacional para Júlio César. Na nova carreira, alcançou o cargo de gerente e tudo parecia perfeito até se dar conta que não ouvia direito. Acabou por perder completamente a audiçãoo e teve que se reinventar.
Primeiro como professor de futebol por meio da Secretaria de Esportes. Mas tudo que Júlio faz é com intensidade. Procurou as autoridades para ampliar seu trabalho, atuar com a população carente. Encontrou em Netinho o parceiro certo. Foi na Cohab de Carapicuíba, na Grande São Paulo, que encontrou sentido para o que fazia. O projeto atendia mais de 800 crianças.
Em seguida foi transferido para o Parque da Aclimação, Zona Sul de São Paulo. Júlio descobriu que ao lado do parque havia uma escola de surdos. Foi aí que a inclusão começou. Trazer esses garotos para o parque, ensiná-los a jogar futebol, a viver com a mesma intensidade de quem marca um gol. Deu certo. Criou uma metodologia própria e seu trabalho foi reconhecido como melhor projeto inclusivo do Brasil. Não ficou só no futebol, foi para a dança com o apoio de sua companheira de todas as horas, a música que ele e os alunos não podiam ouvir, mas podiam sentir.
Por meio das secretarias de Esporte e da Pessoa com Deficiência, levou seu método para outras escolas de surdos e todos os professores de Educação Física do Estado de São Paulo tomaram conhecimento do seu trabalho e de sua metodologia.
Júlio César, que nunca se afastou da música, resolveu, depois de surdo, tocar um novo instrumento, o piano. Com a disciplina do profissional de futebol que treina até a exaustão, dedicava-se ao piano dia e noite.
Na sexta-feira, dia sete de julho, Júlio César tocará ao piano o hino nacional brasileiro na abertura da primeira Mobility Show que será realizada na Marina da Glória, no Rio de Janeiro. A entrada é franca e haverá transporte gratuito a partir da Cinelândia.
Além de tocar durante a feira, Júlio César apresentará no sábado, no Espaço Vivência da Mobility Show, sua palestra “Jogadas da Vida – a superação dos dribles que a vida nos dá”.