Tratamento da disfagia em idosos é fator importante para prevenção de doenças que podem impactar muito na qualidade de vida dos mesmos.
Letícia Freixo (*)
O envelhecimento é um processo contínuo que ocorre em todo organismo e, mesmo assim, é falado muito pouco sobre ele. Nesse processo é natural que as estruturas e funções de vários órgãos sejam alterados e uma das mais comuns é a alteração na biomecânica da deglutição, chamada de presbifagia. Ela se caracteriza pelas modificações na função da deglutição durante o envelhecimento do ser humano, que desencadeia uma adaptação ao processo de alimentação e deixa o idoso propenso a desenvolver disfagia.
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Os idosos que sofrem de presbifagia podem acabar fazendo mudanças e adaptações na alimentação que podem acarretar em um emagrecimento, perda de força muscular, desnutrição, desidratação e até pneumonia ou seja, consequências que podem impactar muito na qualidade de vida dos idosos.
Já a disfagia é um sintoma que geralmente vem de outras doenças, como um AVC, neurodegenerativas, neuromusculares, ou então, quando a pessoa passa por uma alteração mecânica como uma cirurgia de retirada de câncer de cabeça e pescoço, por exemplo.
Tal alteração é acompanhada por uma redução das habilidades musculares e da sensibilidade orofacial e a maior predisposição à redução do reflexo de proteção das vias aéreas, possibilitando a penetração e aspiração de corpos estranhos e, consequentemente, a ocorrência de pneumonias.
Outro ponto importantíssimo é que, segundo demonstrado no X Congresso de Geriatria e Gerontologia do Rio de Janeiro, a taxa de perda de massa muscular de um idoso em 72 horas de internação ou quando infecta é elevadíssima, podendo representar quase 1kg de massa magra perdida. Existem diversas complicações associadas à perda de peso como a redução da imunidade e aumento de risco de infecção e a própria disfagia. Perda de força muscular, dificuldade para sentar e levantar, lesão por pressão, dificuldade de cicatrização e pneumonias por broncoaspiração são outros problemas graves que podem surgir por conta da desnutrição e perda de massa magra.
O grande problema é que por acharem que a alteração no processo de deglutição é algo inerente à idade, muitos idosos não relatam para os profissionais de saúde que, por sua vez, muitas vezes também não analisam e questionam o quadro da maneira mais adequada e acabam perdendo muito tempo para dar início ao tratamento. Um erro muito comum, é ignorar as dificuldades de engolir dos idosos e substituir a alimentação por sopas e cremes.
Por estarem “batidos” ou “liquidificados” ingerem uma comida com valor nutricional reduzido e perdem peso e massa múscular ficando predispostos à essas complicações pulmonares e ainda mais vulneráveis a complicações, principalmente durante as internações. Portanto, estabelecer o que seria o esperado para as funções orofaciais nessa etapa da vida e identificar as anormalidades é essencial visto os riscos de uma ingestão prejudicada pode trazer ao indivíduo idoso e uma vez que o envelhecimento é uma realidade na sociedade mundial.
O aparecimento de problemas como a disfagia em idosos é crescente e a tendência é que continue cada vez maior. Em um estudo publicado pela universidade norte-americana John Hopkins indica que 1 a cada 3 adultos sofrerá com disfagia. Com um diagnóstico precoce os pesquisadores acreditam que será possível prevenir milhares de mortes de pessoas com essa condição.
Na pesquisa do meu mestrado na Universidade de São Paulo (USP), estudei as características supraglóticas dos idosos e suas relações com a deglutição. Analisei as características vocais de algumas pessoas que já têm alterações, além do comportamento faríngeo da deglutição e observei que o comportamento vocal do idoso está associado a alguns componentes faríngeos que já estão comprometidos e que podem ser uma aliados na investigação da deglutição dos idosos.
Por isso sempre recomendo uma avaliação minuciosa dos aspectos nutricionais e físicos, além dos fonoaudiológicos e na detecção precoce dos distúrbios de deglutição dos pacientes que acabam chegando já muito comprometidos para tratamento. O profissional capacitado para essa avaliação é o fonoaudiólogo, e seu envolvimento no acompanhamento de idosos é muito importante. Eles têm o conhecimento necessário para avaliar, entender e, se preciso, encaminhar para outros profissionais que poderão dar um atendimento completo e especializado para o paciente.
Tenho mais de 15 anos de atendimento especializado com idosos, e pude perceber nesse tempo que a incidência de doenças graves decorrentes de infecções, por exemplo, podem ser prevenidas e/ou tratadas com avaliação e terapia clínica e que o grande ponto está na avaliação, descoberta e encaminhamento para o profissional adequado com agilidade, além da inclusão do profissional de fonoaudiologia nas equipes multidisciplinares que cuidam de idosos para que a detecção do problema seja precoce.
(*) Letícia Freixo – Fonoaudióloga formada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, pós graduada pela FOB-USP e mestre na linha de distúrbios da voz, fala e funções orofaciais também pela FOB-USP. Atua como fonoaudióloga de forma integrada aos profissionais de medicina, fisioterapia e nutrição, através do atendimento domiciliar de pacientes idosos e, atualmente, nos tratamentos de apneia do sono leve, moderada e grave. E-mail: [email protected]
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