Os idosos portugueses que vivem em lares tomam muitos medicamentos, alguns não são adequados ao seu estado de saúde e vários são mesmo duplicações. O problema é frequente, a crer nos resultados de um estudo que fez a revisão da medicação de idosos institucionalizados em lares de terceira idade que estavam a tomar pelo menos mais de cinco fármacos por dia. E como será por aqui? Esta é uma pesquisa interessante a ser realizada.
Alexandra Campos *
No total, três quartos destes idosos estavam a tomar medicamentos potencialmente inadequados. Em média, cada um deles sofria de mais de quatro comorbilidades (patologias) e tomava mais de dez medicamentos por dia. Havia um idoso a quem tinham sido receitados 28 remédios.
Duplicação de antidepressivos e ansiolíticos
Mas o que mais surpreendeu pela negativa foi a elevada percentagem de casos (45,8%) em que se detectou a duplicação de medicamentos com o mesmo princípio activo e da mesma classe terapêutica, como foi o caso dos antidepressivos e dos ansiolíticos. Uma fatia não negligenciável dos fármacos prescritos (13,5%) foram mesmo classificados como medicamentos que afectam negativamente os doentes com historial de quedas, como as benzodiazepinas (tranquilizantes e hipnóticos) de longa duração e os antipsicóticos.
“Há muitos casos de duplicação do princípio activo e da classe terapêutica, e o exemplo mais frequente são as benzodiazepinas. Este fenómeno não é um exclusivo de Portugal, mas em Portugal é mais elevado. O problema é que, além da perda de memória, [estes fármacos] provocam um aumento da sonolência e podem induzir quedas, o que é muito perigosos nestas idades”, alerta Filipa Alves da Costa, uma das autoras do estudo.
No artigo agora publicado, os investigadores notam, aliás, que o uso excessivo de ansiolíticos e antidepressivos pela população portuguesa em geral já foi identificado nos Planos Nacionais de Saúde, sendo estabelecida como uma das prioridades para a política do medicamento a redução do seu consumo.
Também há remédios em falta
Ao mesmo tempo, o estudo permitiu detectar outro fenómeno: há alguns “medicamentos potencialmente omissos”, ou seja, fármacos que, tendo em conta a condição clínica dos idosos, deveriam ser prescritos aos idosos. Isto aconteceu em 43% dos casos e os remédios em falta são essencialmente preventivos, como estatinas, cálcio e vitamina D. Uma vez que são mais os medicamentos potencialmente inadequados do que os potencialmente omissos detectados, se fosse feita a revisão da terapêutica, os custos não aumentariam e haveria um aumento da qualidade da terapêutica, alegam.
Apesar das limitações deste estudo – um dos lares convidados acabou por ficar de fora por não ter diagnósticos médicos nos registos clínicos dos idosos, o que inviabilizou a revisão da medicação -, há “oportunidades de intervenção para os farmacêuticos” entre os idosos a viver em lares, devendo estes começar por actuar no sentido de evitarem as duplicações de terapêutica, defendem os autores.
Farmacêuticos devem intervir?
Filipa Alves da Costa admite que a revisão periódica da medicação dos idosos ainda é um caminho por fazer em Portugal e garante que não se pretende abrir uma guerra com os médicos. “A ideia não é a de fazer de polícia dos médicos, mas sim trabalhar em equipas multidisciplinares para encontrar a melhor solução para cada doente”, sugere. Até porque pôr farmacêuticos a fazer a revisão periódica da medicação em lares de terceira idade é uma solução já posta em prática em vários países, como a Suiça e a Holanda, por exemplo.
* Alexandra Campos, acesse aqui, publicado em 06/11/2014