Da grande diva do teatro Bibi Ferreira, passando pelo lendário Paul McCartney e chegando, finalmente, ao charmoso, competente e insuperável Chico Buarque, completamos o trio daqueles ídolos que, cada qual a sua maneira, souberam envelhecer, se é que há uma cartilha ou receita para isso.
É interessante ver como essa geração do pós-guerra está envelhecendo. Experientes, ainda atuantes nas suas respectivas profissões e considerados exemplos, Bibi, Paul e Chico mostram para o mundo que as velhices podem, muito bem, ser diferentes daquilo que guardamos no nosso imaginário como sendo algo estagnado e sem movimento.
Velhices como essas ditam o que vem por aí, comandam costumes, influenciam o mercado, desde vestimenta, calçado, equipamento urbano, cultura e até funcionam como referência do que é ser e estar na vida.
A velhice e o envelhecimento, atualmente, são temas de muitas rodas de conversa, seja em sofisticados restaurantes, botecos, grupos de estudo e porque não dizer, também, de grupos religiosos e/ou intelectuais que pensam e buscam uma existência mais feliz e prazerosa. Os três famosos, ao que parece e nos chega, souberam trilhar seus próprios caminhos, enfrentando crises, perdas, dilemas e seguiram na luta por dias que fizessem sentido e ganhassem significado. Talvez, esse último, o maior desafio.
Para quem se adiante em dizer que só começamos a falar de Bibi pelos seus 90 anos, ledo engano. Sempre se falou de Bibi, seu gênio, sua arte e claro, dos seus “indefectíveis óculos escuros”. E por que esta dama é uma figura que marca? Por respostas como esta, dada a Revista Serafina – Jornal Folha de S.Paulo, Bibi fala de seu aniversário de uma década a menos do seu centenário: “Sabe aquele negócio da madrinha da Bela Adormecida? Pode acontecer de eu ficar cem anos deitada porque não convidei a pessoa certa! Não quero festa”.
Assim ela se define e todos já sabem o que poderão esperar, sem surpresas ou sobressaltos, apenas constatações. Quem espera enormes doses de cuidados, tem que se contentar com coisas simples, de todos nós, não famosos. Ela diz “Minha vida é simples. Acordo e tomo qualquer coisa. Faço o que tenho que fazer e descanso. Por isso, engordo com facilidade. Só como aquilo que engorda. Meu grande problema é o corpo. É uma tragédia shakespeariana.”
Uma nova pergunta: por que nos identificamos com Bibi? Talvez por esse jeito comum de ser mulher, de sofrer pelo corpo, pelos excessos (sempre muito engordativos), de viver algo pequeno como uma grade tragédia grega.
Mas a diva, pasmem, ainda estuda e aprende, tem seus próprios ídolos e os inveja (uma pontinha, talvez). Como declarou à Serafina, Bibi é fã de literatura inglesa e de cinema, ela adora o filme “Capote”, de 2005. Sobre seu protagonista, ela afirma: “Toda a semana toco a ver. A interpretação de Philip Seymour Hoffman é uma das melhores que já vi, pois usa toda a possibilidade física: é a forma de andar, de olhar, principalmente de falar. É um trabalho primoroso. Fico olhando esse homem representando e fico estudando, aprendendo.”
Trajetória
Bibi, ou pelo nome de batismo Abigail Izquierdo Ferreira, subiu ao palco pela primeira vez aos 24 anos de idade e nada mais irônico que tomando “o lugar de uma boneca que se perdera na coxia do espetáculo ‘Manhãs de Sol’, de Oduvaldo Vianna”. Seu pai, ninguém menos que o lendário Procópio Ferreira, iniciava a carreira de ator.
Tinha três anos quando estreou em Santiago num teatro de revista com a mãe, a corista Aida Izquierdo. Aos 14, dançava em óperas no corpo de baile do Theatro Municipal do Rio e compunha música clássica.
Bibi representa a arte como atriz, bailarina, cantora, compositora, diretora, além de carismática e talentosa. É uma profissional, em sua área, considerada completa. Ela lembra: “Sempre fui retraída. Só não sou assim no palco. Lá, perco a inibição. Nunca fui encaminhada para fazer carreira. Era uma moça como qualquer outra daquela geração. Todas estudavam piano, francês e dança. Minha mãe trabalhava muito para pagar os meus professores, e eu estudava o que fosse possível para a minha mãe ficar feliz.”
Serafina pergunta: E o que é importante para ser um ator? Bibi explica: “A primeira coisa é saber se ele tem voz. O microfone colocado hoje nos atores fica muito ruim porque eles perdem o brilho. Nunca trabalhei com microfone. Não tenho necessidade. Deus me deu uma voz muito forte, muito boa. Mas tem também a técnica, a respiração, força no diafragma”.
Não muito chegada aos famigerados exercícios físicos, Bibi resolveu a questão, também, de forma prática e simples. Ela conta que faz todos os dias o roteiro da Força Aérea Canadense, um método lançado em 1958 no livro ‘Mantenha-se Fisicamente em Forma’. Nele, o cientista e atleta Bill Orban propunha uma pequena série de exercícios diários, sem equipamentos: “Aquilo é maravilhoso. Em dez minutinhos, resolve todos os problemas, envolve todos os músculos”, diz Bibi.
Rotina
Focada nas atividades a executar no decorrer do dia, Bibi resume: “Tenho uma rotina obrigatória. Gosto de chegar com calma ao teatro para ter mais concentração. Preciso ter uma paz de duas horas dentro do camarim. Eu fico muito triste e nervosa quando estou atrasada”.
Sobre ‘Gota d’Água’, peça de 1975, de Chico Buarque e Paulo Pontes, então marido de Bibi, ela fala: “É o texto mais importante da dramaturgia brasileira. A censura cortou tanto que ficou uma coisa leite com água. Depois, o Paulinho conseguiu trazer de volta determinados cortes”.
Atuante, Bibi, na época da ditadura, foi ao general Médici pedir a regulamentação da profissão de artista e um desafogo na censura. “No militarismo, eles não entendiam nada. Como ninguém nunca entende de teatro, a não ser quem pisa no palco”, diz.
Saudosa, ela confessa sentir falta, como declarou à Serafina, daquela “fase muito rica da dramaturgia brasileira, com Vianinha, Plínio Marcos, Paulo Pontes. Não tem aparecido uma safra fértil”.
Quando falamos que Bibi é completa, é pelos muitos musicais da Broadway, comédias, textos clássicos que dirigiu e atuou com os monstros do teatro e da música: “De teatro de protesto eu não gostei muito. Porque o protesto muda de mãos. Hoje, você está a favor do comunismo, amanhã, não. O público é um só. Você tem que agradar”.
Ela conta que aprendeu essa filosofia com o pai. “Ele me dizia que há coisas em que você não pode tocar no teatro: futebol, política e religião.”
Mas, infelizmente, vemos que, para muitos, não há posição definida. Se hoje sou daqui é porque interessa ser, amanhã, quem sabe, estarei ali, porque pode ser mais conveniente. Ou talvez, posso ser dos dois lados se assim for oportuno e benéfico. E a roda gira.
Muito definida e segura de suas posições, e não por acaso intérprete de mulheres fortes, como Edith Piaf e a Joana de “Gota d’Água”, Bibi diz à Serafina não querer saber de feminismo. “Acho que a mulher nunca é feliz sem ter uma hora para ficar esperando pelo marido em casa. Sou superdoméstica.”
“A mulher que quer muita liberdade acaba se perdendo. É feito o Noel [Rosa].” E cantarola “Feitio de Oração”: “Quem acha vive se perdendo”.
Sobre seus cinco casamentos, Bibi diz que foram todos muito bons. E, se hoje, tem vontade de namorar? Ela responde categórica: “Não! Seria ridículo na minha idade. Tenho minhas vaidades. Depois de uma certa idade, eu não poderia mais inspirar isso num homem. De jeito nenhum. Embora eu tenha todos os dentes, seja desbarrigada. O homem só gosta é da juventude. O amor é para gente jovem. ‘Love is young’. Fora isso, há amizade, compreensão.”
Ah, Bibi, o amor é para todos nós, não só para os belos e jovens. O amor é como a velhice, democrático. O problema desse “senhor” é que nos deixa marcas. Mas, que importa, mesmo assim, em qualquer fase da vida, nos rasgamos por algumas gotinhas dele. Como canta Milton Nascimento em “Paula e Bebeto”: “Pena que pena que coisa bonita, diga. Qual a palavra que nunca foi dita, diga. Qualquer maneira de amor vale aquela. Qualquer maneira de amor vale amar. Qualquer maneira de amor vale a pena. Qualquer maneira de amor valerá”.
E sobre seu maior prazer hoje? A Diva responde: “Pão francês, se possível com manteiguinha com sal. É a única coisa de que eu gosto para valer. Quase sempre falta aqui em casa e eu dou grandes broncas, fico uma fera”.
Serafina pergunta, sua vida é cor de rosa? “É”, responde.
E para quem não sabe, rosa é a cor da beleza, da saúde, da sensualidade e também do romantismo. Ingredientes que fazem de Bibi Ferreira uma grande dama, não só do teatro, mas da vida.
Alguns podem até não acreditar. Mas o desejo de Paul McCartney para sua velhice era estar sentado numa lareira, enquanto sua esposa tricotaria um suéter. Estranho imaginar o grande nome da música britânica se aposentando, especialmente para os Beatles Maníacos. Tendo completado 70 anos no último dia 18 de julho/2012, a vida do músico nada tem a ver com descanso e muito menos tranquilidade. Aliás, uma vida que se apresenta bem diferente, com uma agenda de trabalho lotada.
Além da turnê de divulgação do seu último disco “Kisses on the bottom” e da homenagem feita ao jubileu de diamante da Rainha Elizabeth ll, Paul está encarregado do show de encerramento dos Jogos Olímpicos de Londres no dia 27 de julho.
Paul ainda possui um poder de influencia imenso, carisma e um grupo seleto de celebridades como fiéis seguidores. A Rainha é apenas uma entre muitos fãs, na longa lista desse senhor de 70 anos, que bem poderia ser considerado “fora de moda”, mas que soube construir uma vida de trabalho e relações duradouras.
Tendo nascido como James Paul McCartney em 18 de junho de 1942, na cidade Liverpool, o jovem, muito cedo se juntaria a uma banda promissora chamada “The Quarrymen”. Não demorou muito para que “The Quarrymen” se tornassem “The Beatles” e a história continua até hoje. Mesmo com o fim da banda, McCartney permaneceu um artista de sucesso, após formar a banda “Wings” com sua primeira esposa, Linda.
Paul está em seu terceiro casamento. “Macca”, como é carinhosamente chamado pelos ingleses, já recebeu diversas homenagens, inclusive do seu amigo, beatle, Ringo Starr no site do YouTube: Acesse Aqui
Francisco Buarque de Hollanda, cantor, compositor e escritor, dois anos mais jovem que Paul, completou em 17 de junho/2012 seus 68 anos bem vividos. Filho do historiador Sérgio Buarque de Holanda, Chico, sempre muito reservado, comemorou seu aniversário com a discrição que lhe é típica.
Com uma carreira impecável, sempre lotando plateias em todos os shows em que se apresenta, vemos um homem que não abre mão da qualidade de vida. Sempre engajado nas causas políticas, o intelectual participou ativamente da luta contra a ditadura no Brasil e segue de perto os rumos do país.
Muito cedo, aos cinco anos de idade, Chico já demonstrava interesse pela música quando recortava dos jornais e colava em um álbum os retratos dos principais artistas do rádio. Quando se tem a arte correndo nas veias, o chamado vem, e acontece em tenra idade, na maior parte dos casos.
Acompanhando o pai, o menino Chico mudou para a Itália onde aprendeu outras línguas e adquiriu uma experiência valiosa no contato com artistas que frequentavam a casa da família, como Vinícius de Moraes. Imaginem conhecer e aprender com o poeta, um encontro para muito poucos.
Sua primeira composição é de 1961, a “Canção dos Olhos”: “Meu Deus, o que será que tem, Nesses olhos teus, O que será que tem, Pra me seduzir, Pra me escravizar, Não sei, E não saberei também, Como resistir, A seu modo amar (…)”.
Esse é Chico e sempre foi Chico, homem culto, inteligente, sedutor, ainda mais aos 68 anos, um homem que conquista pelos lindos olhos verdes que falam de amor, das artes, da política e da vida.
Correspondendo às expectativas da família, o jovem ingressou para o curso de Arquitetura na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU), mas por pouco tempo. A arte já tinha entrado na sua vida e definitivamente.
Os grandes sempre se encontram nas curvas da existência e no I Festival de Música Popular Brasileira, em 1965, Chico conheceu a sempre saudosa Elis Regina (hoje, ela teria 67 anos), a grande vencedora da noite. No mesmo ano ele lançaria seu primeiro compacto Pedro Pedreiro e Sonho de Carnaval.
No ano seguinte, ganhou o Festival com a música “A Banda”. Com o sucesso da composição, mudou-se para o Rio de Janeiro onde gravou seu primeiro LP. Ainda em 1966 conheceu a atriz Marieta Severo Lins, com quem acabaria se casando.
Após o início do AI-5, teve a peça Roda Viva censurada e foi investigado pelo Comando de Caça aos Comunistas (CCC). Discordando do momento político vivido no país, Chico se auto-exilou na Itália em 1969, onde chegou a lançar dois LPs. Retornou ao Brasil em 1970 e lançou seu quarto disco. Nesse ano também compôs “Apesar de Você” que vendeu mais de 100 mil cópias e se tornou um hino contra a ditadura.
Na década de 80 manteve sua luta contra o regime militar no Brasil compondo e militando pelo o fim da ditadura. Em 1991 lançou seu primeiro romance Estorvo. O segundo viria em 1995, Benjamin. Estorvo viraria filme no final dos anos 90 e Benjamin iria para as telas em 2003. Publicou ainda Budapeste que também chegou aos cinemas. Ao longo de sua carreira, até agora, Chico Buarque lançou 53 discos, escreveu peças como Opera do Malandro e Calabar, além de obras infantis, como Chapeuzinho Amarelo.
No último dia 26 de junho Gilberto Gil completou 70 anos junto a seus oito filhos e oito netos, embarcando em seguida para Londres, para participar no “Back2Black Festival” ao lado da Orquestra Sinfônica de Londres, no dia 4, acompanhado por Flora Gil, sua mulher. Gil só reduziu seu número de concertos pelo mundo na época em que foi ministro da cultura.
Gil faz parte da geração de músicos de Chico Buarque, assim como Caetano e Roberto Carlos, e neste ano também comemora 50 anos de carreira. É um dos fundadores do movimento tropicalista junto com Caetano Veloso, Gal Gosta, Maria Bethânia, Jorge Ben, Tom Zé, Torquato Neto e Os Mutantes. Nos anos 60, ajudou a fundar a Tropicália.
Em declaração à imprensa nacional, Gil, reconhecido como músico e instrumentista extraordinário, além de grande violonista e letrista, diz que “conforme a idade, cada período da vida tem o seu conforme”. Gil tornou-se conhecido no programa de televisão “O Fino da Bossa”, comandado por Elis Regina, viveu a ditadura brasileira, junto com Caetano foi preso, buscou exílio na Europa, onde ouviu Bob Marley pela primeira vez. Voltou ao país, ingressando na política no final dos anos 80, depois assumiu o Ministério da Cultura no início do governo Lula, em 2003, após consultar os amigos.
Bibi, Paul, Chico e Gil, um quarteto que se fez na linha do tempo, que vivem e viveram suas fases intensamente e sem desculpas. Se sofreram, se arrependimentos assombraram, se tropeços tiveram? É muito provável que passaram por tudo e acabaram construindo suas velhices com um jeito próprio, particular e original de ser, estar, viver e passar pela vida. Um brinde à eles, não à vida eterna, mas a uma vida regada de satisfação e significado.
Referências
LUCENA, E. (2012). Bibi, diva aos 90. Disponível Aqui. Acesso em 03/06/2012.
REDAÇÃO ADMINISTRADORES (2012). Paul McCartney completa 70 anos a todo vapor. Disponível Aqui. Acesso em 20/06/2012.
CORREIO DO BRASIL (2012). Chico Buarque, aos 68 anos, vive momento novo e inspirado. Disponível Aqui. Acesso em 20/06/2012
ORTIZ, Fabíola (2012). “Parece que todos os anos Gil está fazendo 70”, diz Flora, mulher do cantor há 32 anos”. Disponível Aqui. Acesso em 26/06/2012.