No primeiro final de semana do mês de julho fui visitar, junto com toda família e agregados, uma exposição do grande amigo Hans Born, que está nas Thermas Antônio Carlos, em Poços de Caldas (MG), um prédio erguido em 1931 e com arquitetura em estilo neorromano e um teto de vitral que encanta o olhar, hoje administrado por Teresa Cristina Alvisi, outra amigona.
Beltrina Côrte
No ano passado, quando estive junto com meu marido em Poços de Caldas para uma palestra sobre mídia e envelhecimento, a convite do NEPPE (Núcleo de Estudos e Pesquisa sobre o Processo de. Envelhecimento da PUC-Poços de Caldas), Hans e Tomiko nos convidaram para ir até Caldas (MG), onde estão desde que se aposentaram e saíram de São Paulo. Na ocasião, Hans nos mostrou sua última arte, sim, Hans é assim, desde quando o conheci, antes da famosa Tomiko (desculpe Tomiko, mas hoje a estrela é nosso querido Hans), volta e meia ele inventava algo. Quando era meu vizinho e colega de trabalho, transformou o porão da casa em uma oficina de brinquedos de madeira. Minhas filhas, especialmente a mais velha, tem uma coleção deles. Aliás, suas artes estão espalhadas pela casa toda, desde a cozinha, com um descanso de mesa nomeando os diversos tipos de madeira, nos quartos das gêmeas estão desde brinquedo de anéis até uma caixa contendo vários tamanhos de madeira, até meu quarto com um vaso solitário que amo de paixão. E mais duas recém adquiridas na exposição. Ah, ia esquecendo de dizer, se você gostar de alguma pode e deve comprar. No catálogo, Hans informa como as obras, uma a uma, são precificadas.
Há pessoas que leem letras
E soletram palavras
Entre frases de festa ou de feiras.
Hans Born, o artesão, largou de lado o livro
E aprendeu a ler madeiras.
Conhece elas todas
Só de tocá-las com a mão.
E sabe os seus nomes, a raça
E de onde vem, e se servem,
Para a arte, o fogo ou a construção.
Cada toco de pau para ele
Existe entre o milagre e a maravilha!
E trata cada táboa à toa
Como se fosse uma única:
Madeira ou filha.
E se de algum acaso
Não sabe ainda o nome,
Não dorme, esquece o sono
E busca em almanaques
Da ciência da botânica
Até que aprende de cor
Como o seu nome soa,
Pois para Hans Born
Artesão de oficina,
Cada madeira é uma pessoa.
Os japoneses,
Quando sonham imagens
De outono, verão,
Inverno e primavera,
Pintam palavras de harmonia
E depois penduram na parede
Isso que é quadro,
Poema e melodia.
Com a graça
Da terra de Tomiko
E sua sutil sabedoria,
Hans Born escreve com formão,
Poli palavras com cera e lixa fina
E depois espalha pela casa
As suas folhas de madeira-poesia.
O fascínio pelas madeiras
Depois da exposição fomos todos para Caldas, para que as meninas vissem as transformações realizadas na casa que conheceram cerca de oito anos atrás, quando eles se mudaram. O terreno do lado, antiga garagem, deu lugar a um maravilhoso Barracão (assim é chamado), ponto de encontro de ideias, sonhos, conexões de pessoas que almejam um mundo melhor. Ali, outras artes do Hans: mesas de madeira, bancos, balcão, além de quadros. Todas elas tendo as madeiras nomeadas. O jardim, ampliado e cuidado por Hans, sofreu muitas reformulações, agora mais florido, mais perfumado e colorido, contendo até um “tanque” cheio de carpas. Pena que o sapo martelo/dourado ali não se encontra mais. Cheguei até a regar as plantas, muitas das quais Tomiko tempera suas comidas. Voltei à minha infância, lá na Ilha, quando se regava os “poios”…
E, é claro, fizemos o lanche da tarde com um maravilhoso bolo feito por Tomiko.
Hans tinha 10 anos em 1945, justamente quando a Segunda Guerra terminava. Ele lembra que sua casa, localizada em Gerolstein, perto de Colonia (Alemanha), fora destruída e que ele, menino, ajudou os carpinteiros a reconstruí-la, encaixando as madeiras… Somente agora percebe que, já na época, gostava de mexer nelas.
Hans chegou ao Brasil em 1966.
Lembra que sempre que podia gostava de criar. E é verdade, eu e minhas filhas somos testemunhas disso. Com seu macacão velho e surrado, Hans se enfiava no porão e ali ficava horas a fio. Uma vez saiu de lá com um carrinho, não de madeira, mas de garrafas pet, que fez a festa da Carol e que o puxou por muito e muito tempo. A originalidade encantava a todos. Vieram várias peças, entre elas ele nomeia os quebra-cabeças e os caleidoscópios… Talvez eles já fossem o embrião de suas peças atuais, muitas elaboradas a partir de padrões de desenho geométrico.
Assim o tempo foi passando e quando finalmente se aposentou, ele e Tomiko decidiram morar em uma cidade mais calma, e que lhes dessem uma qualidade de vida com o que ganhavam como aposentados. Escolheram Caldas, pertinho de Poços de Caldas (MG), e ali Hans, de novo, montou sua oficina e a foi enchendo com madeiras.
Foi em Caldas que Hans descobriu os diversos tipos, cores, fibras e perfumes das diferentes madeiras que chegavam às suas mãos.
Um dia conheceu uma senhora que se queixava de seu filho pequeno, pois ele não conseguia se concentrar na sala de aula. Ele então pediu para dar aula de xadrez à direção da escola, primeiro para os professores e depois para os alunos do ensino fundamental. Mas nem tabuleiro nem peças de xadrez a escola tinha.
Resta saber qual será o próximo brinquedo de Hans Born, o artesão alemão zen, que reinventa sua vida em cada obra que produz. Podem deixar, que se eu souber eu os aviso, pois vale a pena ver, ouvir e sentir a paixão que brota do casal que eu tanto admiro, Hans e Tomiko Born. Sim, pois Tomiko é sua grande incentivadora.
Exposição
Madeira-Madeiras: Chapadas Altas Verticais, Vazadas e Minas, e outras Gerais
Local: Thermas Antônio Carlos
Rua Junqueiras, S/N – Poços de Caldas (MG)Tel. (35) 3697-2317