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A doença de Alzheimer não é o envelhecimento normal

O Alzheimer é um dos maiores desafios médicos e sociais da nossa geração. Hoje, entre as dez maiores causas de morte no mundo, o Alzheimer é a única que não podemos prevenir, curar ou até desacelerar. Entendemos menos sobre a ciência do Alzheimer do que outras doenças, porque investimos menos tempo e dinheiro para essa pesquisa.

Samuel Cohen (*)

 

Em 1901, uma mulher chamada Auguste foi levada para um asilo médico em Frankfurt. Auguste estava delirando e não conseguia se lembrar nem dos detalhes básicos de sua vida. Seu médico chamava-se Alois. Alois não sabia como ajudar Auguste, mas cuidou dela até que, infelizmente, ela faleceu em 1906. Após o falecimento, Alois fez uma autópsia e encontrou placas e emaranhados estranhos no cérebro de Auguste, tipos que ele nunca havia visto anteriormente.

Agora vem o mais impressionante: se Auguste estivesse viva atualmente, não poderíamos ajudar mais do que Alois, 114 anos atrás. Alois era o Dr. Alois Alzheimer. E Auguste Deter foi a primeira paciente diagnosticada com o que chamamos de Doença de Alzheimer. Desde 1901, a medicina avançou bastante. Descobrimos antibióticos e vacinas para nos proteger de infecções, muitos tratamentos para o câncer, antirretrovirais para HIV, estatinas para doença cardíaca e muito mais. Mas não fizemos qualquer progresso no tratamento para a Doença de Alzheimer.

Eu integro um grupo de cientistas que tem trabalhando para encontrar a cura do Alzheimer há uma década. Então, penso sobre isto o tempo todo. O Alzheimer afeta, atualmente, 40 milhões de pessoas no mundo. Mas, até 2050, vai afetar 150 milhões de pessoas… e, a propósito, isto incluirá muitos de vocês. Se você espera viver até 85 anos ou mais, sua chance de ter Alzheimer será quase uma em duas. Em outras palavras, existe a chance de você passar a terceira idade ou sofrendo de Alzheimer, ou ajudando a cuidar de um amigo ou ente querido com Alzheimer. Somente nos Estados Unidos, os cuidados com Alzheimer custam US$ 200 bilhões todo ano. Um em cada US$ 5 de assistência médica é gasto com Alzheimer. É a doença mais cara atualmente, e estima-se que os custos vão aumentar cinco vezes mais até 2050, à medida que a geração do “baby boom” envelhece.

Pode surpreender vocês que, simplificando, o Alzheimer seja um dos maiores desafios médicos e sociais da nossa geração. Mas fizemos relativamente pouco para abordá-lo. Hoje, entre as dez maiores causas de morte no mundo, o Alzheimer é a única que não podemos prevenir, curar ou até desacelerar. Entendemos menos sobre a ciência do Alzheimer do que outras doenças, porque investimos menos tempo e dinheiro para essa pesquisa. O governo dos EUA gasta dez vezes mais todos os anos em pesquisas de câncer do que Alzheimer, apesar do fato de que o Alzheimer nos custa mais e causa um número de mortes a cada ano semelhante ao câncer.

A falta de recursos origina-se de uma causa mais fundamental: a falta de conscientização. Porque aqui está o que poucos sabem mas todos deveriam saber: Alzheimer é uma doença, e nós podemos curá-la. Na maior parte dos últimos 114 anos, todo mundo, incluindo cientistas, confundiram Alzheimer com envelhecimento. Nós achávamos que ficar senil era uma parte normal e inevitável de envelhecer. Mas basta olhar uma foto de um cérebro envelhecido saudável comparado ao de um paciente com Alzheimer para ver o verdadeiro dano físico causado por esta doença. Além de desencadear perda severa de memória e habilidades mentais, o dano ao cérebro causado pelo Alzheimer reduz significativamente a expectativa de vida e sempre é fatal.

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Lembrem-se que Dr. Alzheimer encontrou placas e emaranhados estranhos no cérebro de Auguste há um século. Por quase um século, não soubemos muito sobre isso. Hoje, sabemos que são feitos de moléculas de proteínas. Imaginem uma molécula de proteína como um pedaço de papel que normalmente se dobra em um origami elaborado. Existem pontos no papel que são pegajosos. E quando é dobrado corretamente, esses pontos ficam na parte de dentro. Mas, algumas vezes, as coisas dão errado, e alguns pontos pegajosos ficam para fora. Isto faz as moléculas de proteínas grudarem umas nas outras, formando aglomerados que eventualmente se tornam placas e emaranhados grandes. Isso é o que vemos nos cérebros de pacientes com Alzheimer.

Passamos os últimos dez anos na Universidade de Cambridge tentando compreender como funciona este distúrbio. Há muitos passos, e identificar o passo que deve ser bloqueado é complexo, como desarmar uma bomba. Cortar um fio pode não fazer nada. Cortar outros pode fazer a bomba explodir. Precisamos descobrir qual passo bloquear, e criar um medicamento que faça isso.

Até recentemente, nós, na maioria das vezes, cortamos os fios esperando pelo melhor. Mas agora reunimos um grupo diverso de pessoas: médicos, biólogos, geneticistas, químicos, físicos, engenheiros e matemáticos. E, juntos, conseguimos identificar um passo crítico no processo e estamos testando uma nova classe de medicamentos que vai bloquear este passo e parar a doença.

Agora vou mostrar alguns dos últimos resultados. Ninguém fora do nosso laboratório viu isto ainda. Vamos ver alguns vídeos sobre o teste desses medicamentos novos em minhocas. À esquerda são as minhocas saudáveis, e, como podem ver, se movem normalmente. As minhocas do centro, por outro lado, têm moléculas de proteínas grudando umas nas outras dentro delas, como os humanos com Alzheimer. E podem ver claramente que estão doentes. Mas se dermos os medicamentos novos para essas minhocas numa fase inicial, vemos à direita que ficam saudáveis, e vivem uma expectativa de vida normal. Isto é apenas um resultado inicial positivo, mas pesquisas como esta mostram que o Alzheimer é uma doença que podemos entender e curar.

Após 114 anos de espera, enfim existe a esperança sobre que pode ser atingido nos próximos 10 ou 20 anos. Mas, para aumentar a esperança e vencer o Alzheimer, precisamos de ajuda. Isto não se trata de cientistas como eu… trata-se de vocês. Precisamos que aumentem a conscientização de que o Alzheimer é uma doença e que, se tentarmos, podemos vencê-la. No caso de outras doenças, os pacientes e suas famílias fizeram pressão por mais pesquisas e pressionaram os governos, a indústria farmacêutica, cientistas e reguladores. Isso foi essencial para o avanço no tratamento do HIV no fim dos anos 80. Hoje em dia, vemos o mesmo avanço para vencer o câncer.

Mas os pacientes com Alzheimer não podem falar por eles mesmos. E suas famílias, as vítimas escondidas, cuidando dos seus entes dia e noite, geralmente estão muito desgastados para sair e pedir mudanças. Então, realmente está na mão de vocês. O Alzheimer não é, na maior parte, uma doença genética. Todos que possuem cérebro correm risco. Hoje, existem 40 milhões de pacientes como Auguste, que não podem fazer a mudança que precisam para si. Ajudem a dar voz para eles, e ajudem a exigir uma cura.

(*)Samuel Cohen – pesquisador em Química Biofísica no St. John’s College e no Centro de Doenças de Misfolding no Departamento de Química da Universidade de Cambridge. Cohen trabalhou como consultor no escritório de Londres do Boston Consulting Group (BCG), onde se especializou nos setores de saúde, tecnologia e mídia. Sua pesquisa científica se concentra em transtornos neurodegenerativos. É co-autor de mais de 20 artigos científicos, capítulos de livros e patentes, e recentemente foi autor principal de um estudo amplamente divulgado, no qual os pesquisadores fizeram uma grande descoberta para encontrar uma cura para a doença de Alzheimer. Tradução de Jessica Ranft e revisão de Fernando Gonçalves. Palestra no TED @ BCG Londres · Filme Jun 2015.

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