Portugal – Já não trazia, há algum tempo, à vossa consideração um problema de ordem estritamente social, o que se justifica, não pelo desapego a este tipo de preocupações, mas porque outras se têm insurgido como mais actualizadas.
Anabela Melão *
As sociedades europeias confrontam-se com grandes problemas suscitados pelo envelhecimento populacional, desde o declínio da população activa, ao envelhecimento da mão-de-obra, à pressão sobre os regimes de pensão e as finanças públicas, à necessidade de redes formais de prestação de cuidados e serviços aos idosos, aos maus-tratos infligidos em contexto familiar e institucional. Dados recentes da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) apontam para uma primeira sociografia da vítima (mulher, entre os 65 e 75 anos, reformada, a residir no meio urbano) e do agressor (cônjuges, filhos do sexo masculino entre os 35-45 anos).
A definição do conceito de abuso de idosos não é consensual, nem sequer juridicamente, mas é certo que se refere a um comportamento destrutivo dirigido a um adulto idoso que ocorre num contexto de confiança e cuja frequência (única ou regular) não só provoca sofrimento físico, psicológico e emocional, como representa uma séria violação dos direitos humanos. Tal coincide com a própria definição adoptada pelo Conselho de Europa e pelas Nações Unidas. Independentemente da diversidade conceptual existente neste domínio, o conceito integra vários tipos de mau trato, designadamente o abuso físico, psicológico, material e financeiro, e a negligência – activa e passiva. Todos igualmente preocupantes e reprováveis.
Os idosos inculcam atitudes de culpa, de baixa auto-estima, de isolamento social, entram em depressão, reforçam as suas dependências e sofrem do estigma social que se começa a gerar à sua volta. Os maus-tratos às pessoas idosas também são, diria que são essencialmente, um problema de Direitos Humanos. O que deve chamar a nossa atenção para a violência do dia-a-dia, começando por explicar ao idoso que nada nem ninguém tem o direito de infligir na sua honra ou na sua pessoa qualquer tipo de destrato, ou sequer negligência, ou sequer menosprezo. E denunciando à comunidade, e, sendo caso disso, às autoridades competentes, situações deste tipo.
Um país mede-se pela sua atitude para com as crianças, mas é bom que não nos esqueçamos que se mede, igualmente, pela sua atitude para com os mais velhos. A quem devemos, nada mais nada menos, que a vida. Ou seja, muito do que somos. A seu tempo, trataram-nos com enlevo e dedicação. Hoje, chegou a nossa vez de retribuir. É o mínimo que podemos exigir a nós próprios. Um altruísmo que se converte num egoísmo quando lhes percebemos o sorriso, e mais, ainda, quando contribuímos para ele.
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