Jorge Félix *
Dentro do debate sobre o crescimento econômico, começa a ganhar espaço – e certa concordância entre economistas – a proposta de o Brasil adotar políticas de estímulo à fecundidade. Algo distante de um país que sempre se enxergou como jovem e que tem como ícone a imagem da mãe, principalmente, nordestina, seguida de filhos em alturas próximas a formar uma “escadinha”.
Há cinco anos, em palestras e entrevistas sobre o envelhecimento populacional, venho apresentando a ideia de que o Brasil precisava adotar, imediatamente, políticas de estímulo ao segundo filho como os países europeus. Um dos primeiros eventos públicos onde apresentei essa sugestão foi o VII Fórum da Longevidade, em 2012, em debate com o Prof. David Bloom, do Departamento de Demografia da Universidade de Harvard. Na ocasião (como em outras apresentações que fiz), muitos receberam a questão como futurologia e com certo grau de ceticismo.
De acordo com essas previsões a taxa de fecundidade só cairia a menos de 2,1 filhos por mulher na metade do século e nós atingimos 1,8 filho por mulher em 2008. Logo, como nossa expectativa de vida manteve seu ritmo de crescimento, atingindo 74 anos, o processo de envelhecimento foi acelerado.
No 11º Fórum de Economia da Fundação Getúlio Vargas, tradicional evento organizado pelos professores Bresser-Pereira e Yoshiaki Nakano, que terminou no dia 16 de setembro, um dos temas que apareceram no debate sobre produtividade e custo do trabalho foi justamente o porquê de o Brasil, até agora, ignorar – mesmo em termos de discussão de política pública – a adoção de tais incentivos para ampliar o número de nascimentos. Por quê?
Porque o aspecto demográfico vai continuar pesando sobre o custo do trabalho e pressionando a produtividade, isto é, causando inflação. A despeito de o tema produtividade ser bastante complexo – e aqui o objetivo não é analisá-lo em detalhes -, a dinâmica demográfica bate à porta quando procura-se reduzir o custo unitário do trabalho. Até agora, foi mais discutido entre economistas o fato de a redução da entrada de jovens no mercado ajuda a manter a taxa de desemprego baixa. Por outro lado, porém, a demografia contribui para manter a correção dos salários acima da produtividade.
Todos os palestrantes do fórum destacaram essa “boca de jacaré” nos gráficos entre produtividade e evolução dos salários. É uma realidade. Mas é preciso destacar um outro aspecto que pouco aparece no debate. A demografia está reduzindo bastante a margem das empresas brasileiras para promoverem uma rotatividade do trabalho sob critério de idade. Ou seja, demitir o trabalhador maduro – a partir dos 45 anos – e substituí-lo pelo “jovem talento” de custo mais baixo. Esse fenômeno, pouquíssimo pesquisado aqui no Brasil, tem seu papel quando se discute produtividade.
Em que pese o custo de demissão (sobretudo com o acréscimo de mais 10% de multa sobre o FGTS), esse “jovem talento” desapareceu em quantidade, por efeito da baixa fecundidade, e em qualidade, por efeito da baixa educação da geração que chega hoje ao mercado de trabalho (um jovem de 20 anos, portanto, nascido em 1994, entrou na escola quando o país iniciava a universalização do ensino, algo concretizado apenas em 2000).
Produtividade depende, como se sabe, de investimento, infraestrutura, pesquisa e desenvolvimento, saúde entre tantos fatores, mas também de quantidade de oferta de trabalho. Se a população economicamente ativa diminui, se a população em idade ativa encolhe, quem produz precisa produzir mais e melhor.
Os países europeus, envelhecidos na década de 1970, enfrentam esse desafio com alguma flexibilidade na imigração (caso da França) e estímulos à taxa de fecundidade, com licença maternidade maior (no Reino Unido é de um ano e meio), subsídio à escola do segundo filho entre outras ideias criativas. O professor José Pastore, da USP, citou no 11º Fórum de Economia, a proeza do Japão em pagar um cruzeiro romântico de oito dias para os jovens casais. O Japão, país mais envelhecido do planeta, corre para reduzir seu prejuízo.
O Brasil poderia sair na frente. O nordeste não é mais nossa maior taxa de fecundidade. E os casais mais pobres da população também estão tendo menos filhos. Atualmente, a região norte é onde nascem mais brasileiros. No entanto, com a ampliação da luz elétrica por lá, logo a taxa de fecundidade cairá. E isso não é piada. É constatação empírica.
No debate da FGV, o tema foi levantado pelo professor Luiz Felipe de Alencastro, grande conhecedor do que se passa pelo mundo. Ele sabe que essas políticas demoram a produzir resultados. Não é porque o governo oferece vantagens que a mulher vai ter mais filhos. Vejam o caso da Alemanha. Ou mesmo do Japão. Por isso, o Brasil deveria pensar nessa política já. De forma preventiva. O envelhecimento humano é uma conquista. Não é uma doença que alguns acham que podem curar. Mas o envelhecimento populacional deve ser controlado sob pena de dificultar o desenvolvimento econômico e produzir mais desigualdade social.
Referência
FÉLIX, Jorge (2011). Viver muito. São Paulo: Editora Leya.
* Jorge Félix é jornalista, professor, doutorando em Sociologia e mestre em Economia Política pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, onde também é pesquisador (CNPq) do tema envelhecimento populacional. É colaborador do Portal do Envelhecimento. Este texto foi publicado no seu blog Economia da Longevidade, no dia 16 de setembro 2014. Acesse Aqui