Qual será o limite para que os nossos legisladores, que já recebem salários e benefícios diretos e indiretos muitíssimo superiores aos um-mil-e-trinta-e-nove-reais mensais, seguirem gastando livremente, sem se importar com os contextos econômicos que alguns deles próprios apontam como sendo exigências imperiosas para a redução de despesas públicas com o SUS?
Paul Robin Krugman é um economista norte-americano que ganhou o Prêmio Nobel de Economia de 2008 e que desde o ano de 2000 é colunista do jornal The New York Times. Li alguns de seus artigos e, em vários, encontrei uma repetição de abordagem sobre a dívida pública dos Estados Unidos. Escrevo isso porque resolvi voltar a um tema já escrito antes. Durante o mês de fevereiro, li duas matérias relacionadas aos gastos com a função orçamentária Legislativa, executada pelo Senado Federal, com serviços relacionados à saúde. Mas não é saúde do povo, e sim, de uma seleta casta de beneficiados pelas autodecisões daquela Casa.
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No dia 02/02/2020, as jornalistas Bruna Aidar e Rafaela Lima escreveram[1] sobre os gastos com despesas médicas no Senado, que chegaram a R$ 14 milhões de reais em um ano, o que corresponde a quase o triplo de gastos ocorridos uma década antes. Deste valor milionário, R$ 5 milhões foram destinados a ressarcir gastos dos senadores e também dos ex-senadores.
Um adendo: sabemos que se trata de, parte daquele valor, para pagar serviços médico-hospitalares, odontológicos e laboratoriais. Mas os detalhes não são muitos: diz um trecho da matéria que “O Senado alega que não detalha as despesas e tampouco identifica fornecedores ou prestadores de serviços de saúde porque são informações ‘legalmente protegidas em respeito à intimidade das pessoas, nos termos do art. 31 da Lei de Acesso à Informação (12.527/2011)”.
Evidentemente, quem tem bom senso, não precisa saber quem, por exemplo, gastou com atendimentos decorrentes de Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST), ou câncer ou Aids, nominando tais gastos e tais pacientes. Mas seria interessante saber se, por exemplo, alguém foi beneficiado pelo pagamento ou ressarcimento de despesas com procedimentos estáticos. Tempos atrás, na Câmara, um deputado federal foi ressarcido por uma conta milionária com a troca completa dos seus dentes. Coisas assim precisam ser explicadas sim, pois o povo, o pagador de tributos, tem o direito de saber onde vai parar o dinheiro do Erário. Não dizer o tipo de tratamento médico não significa dizer qual prestador recebeu determinado valor do gasto público. Ou há algo a esconder, nobres senadores e senadoras da República?
Cerca de duas semanas depois, em 18/02/2020, a coluna Painel[2] noticiou que o presidente daquela casa legislativa “Alcolumbre amplia plano de saúde a filhos de servidores do Senado para 33 anos”. Se no Senado, tal benefício aos rebentos e rebentas dos nobres senadores e senadoras da República começou a valer a partir desse ano, lá ao ladinho, na Câmara Federal, já vale desde 2016. Ou seja, filhos e filhas de deputadas e deputados federais têm igual benefício. Mas não só os descendentes diretos: enteados e enteadas também gozam de tal benefício.
É curioso perceber um clima de “Brasil colonial”: os amigos do “rei” e da “rainha” são beneficiados. Já o povo… Até quando? Qual será o limite para que os nossos legisladores, que já recebem salários e benefícios diretos e indiretos muitíssimo superiores aos um-mil-e-trinta-e-nove-reais mensais, seguirem gastando livremente, sem se importar com os contextos econômicos que alguns deles próprios apontam como sendo exigências imperiosas para a redução de despesas públicas com o SUS? Lembrando que uma pesquisa do IBGE apontou que 54 milhões de brasileiros e brasileiras receberam, em média, R$ 928 mensais em 2018…
Bacana ver o entusiasmo, o fervor de senadores e senadoras e deputados e deputadas federais discursando no púlpito do Congresso Nacional, falando de boca cheia que o Estado precisa diminuir de tamanho. Dizem isto quando o gasto é direcionado a atender os outros, ou seja, o povo. Já quando o gasto é com eles próprios, o silêncio parece sepulcral. Talvez, meia dúzia de vozes diferentes, mas que entre tantos deles, soam a um murmúrio distante e enfraquecido.
Nossos nobres agentes políticos do Poder Legislativo Federal parecem sofrer de alguma amnésia seletiva, porque não demonstram a mesma exultação, alacridade, gáudio, goivo, júbilo, regozijo, apetite, arroubo, disposição, elã, fervor, gana, ímpeto, rompante, vontade… Nossa, depois de tantos termos rebuscados assim, espero não estar com alguma “doença” transmissível por pessoas daquele ambiente. Até porque, no meu caso, não sou nem senador, nem deputado federal e a conta não vai para a Mãezona, o Erário…
Notas
[1] Disponível em: https://www.metropoles.com/brasil/politica-br/senado-gastos-com-despesas-medicas-explodem-e-chegam-a-r-14-mi.
[2] Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/painel/2020/02/alcolumbre-amplia-plano-de-saude-a-filhos-de-servidores-do-senado-para-33-anos.shtml
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