Intervenções na promoção do envelhecimento ativo para prevenir o comprometimento cognitivo têm se mostrado eficazes. Entre eles, programas universitários para idosos, que compensam o declínio associado à velhice e melhoram a saúde.
Esther Sitges Maciá (*)
O envelhecimento da população é uma tendência global incontestável, com impacto social em todos os níveis, a tal ponto que, como declarado no Relatório sobre a População Mundial da ONU (2017) , é uma das transformações sociais mais significativas do século XXI, com consequências nos serviços, saúde, educação, estrutura familiar, formas de convivência ou laços intergeracionais, entre outros.
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Ao longo do processo de envelhecimento, as mudanças que experimentamos estão relacionadas em parte a fatores genéticos, mas também às atividades que realizamos ao longo do nosso ciclo de vida, como atividade física, alimentação ou formação acadêmica adquirida.
Talvez seja por isso que, em 2002, a Organização Mundial da Saúde definiu o termo envelhecimento ativo como o “processo de otimização das oportunidades de saúde, participação e segurança, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida dos idosos”. Este conceito foi baseado no modelo de envelhecimento bem sucedido desenvolvido por Rowe e Kahn que, apesar de ser um bom ponto de partida, tem sido criticado por se concentrar principalmente nas áreas mais biomédicas e não considerar outras dimensões como saúde mental ou outras variáveis que também contribuem para o envelhecimento ativo e saudável.
Assim, em 2012, a OMS ampliou sua definição de “envelhecimento ativo e saudável”, incluindo claramente uma perspectiva biopsicossocial. Foi então considerado como “o processo de otimização de oportunidades de saúde, participação e segurança, com o objetivo de aumentar a expectativa de vida saudável e a qualidade de vida”.
Ativo, independente e integrado
Na 69ª Assembleia Mundial da Saúde, os objetivos foram definidos na Estratégia Global e no Plano de Ação 2016-2020. Os países foram instados a adotar mudanças tanto na legislação quanto na educação, de modo que os sistemas de saúde e bem-estar fossem sustentáveis e incentivassem os idosos a permanecer ativos, independentes e totalmente integrados à sociedade.
Além disso, a OMS faz referência explícita ao papel que o ensino superior deve desempenhar nesse processo de “proporcionar oportunidades de participação social e desempenho de funções sociais significativas, combatendo assim processos que marginalizam e isolam os idosos”.
Na Espanha, mais de 19% da população tem 65 anos de idade ou mais e as projeções indicam que essa proporção aumentará para 29% dentro de 50 anos. Diante dessa realidade, a universidade espanhola adaptou suas estruturas e estudos há quase 30 anos para acomodar o treinamento especificamente voltado para esse grupo: os Programas Universitários para Mayores (PUM). Desde que o primeiro PUM foi criado em 1993 na Pontifícia Universidade de Salamanca, eles já estão totalmente integrados na oferta acadêmica da grande maioria das universidades espanholas. No ano letivo de 2018/2019 havia um total de 63.146 alunos matriculados.
Estes estudos assumem a filosofia de uma educação permanente, baseada no modelo de aprendizagem ao longo da vida, em que, além de adquirir conhecimento, os alunos se beneficiam criando novas redes sociais e participando de relacionamentos intergeracionais. Tudo isso também pressupõe os objetivos da OMS de alcançar, através do ensino superior, uma maior participação social dos idosos, entendida como o envolvimento em atividades voluntárias, o engajamento cívico e com a comunidade. Numerosos estudos mostram seus efeitos benéficos na longevidade ou satisfação com a vida, entre outros.
É inegável que o PUM contribuiu, ao longo destes quase 30 anos, para o empoderamento dos idosos, e ajudou a satisfazer os desejos da formação universitária de pessoas que, na sua juventude, não poderiam estar satisfeitas por questões sociais, econômicas ou culturais.
Além disso, hoje encontramos uma heterogeneidade de treinamentos e propostas culturais em praticamente todas as universidades espanholas. Os alunos, além da frequência às aulas, realizam outros tipos de atividades, como a participação em ações voluntárias, liderando projetos culturais, colaborando em pesquisas ou projetos de ação social, etc.
Em suma, os PUMs desempenham um papel importante no desenvolvimento e promoção do envelhecimento ativo e bem-sucedido no contexto da participação social. No campo cognitivo, há evidências crescentes sobre a eficácia de tais intervenções na promoção do envelhecimento ativo como uma estratégia preventiva do comprometimento cognitivo para compensar o declínio associado ao processo de envelhecimento e promover a autopercepção positiva do envelhecimento, cuidados pessoais e estado de saúde.
(*)Esther Sitges Maciá é professora titular do Departamento de Psicologia da Saúde e diretora de área do Programa Integral para Mayores da Universidade Miguel Hernández, Espanha. Originalmente publicado pela The Conversation. Tradução livre de Mario Lucena. Foto: Marcos Santos / USP Imagens