Arlete Salles vive um momento único em sua carreira, graças à exuberante e desbocada Copélia, de ´Toma lá, dá cá´. A atriz confessa que no princípio se assustou com o papel. Parei de me preocupar porque a reação do público foi positiva´
Elizabete Antunes
Arlete Salles como Copélia: o personagem agradou (Foto: TV Globo / Renato Rocha Miranda)
Arlete Salles teve que pensar antes de aceitar o convite para viver a transgressora Copélia, em ´Toma lá, dá cá´. Ficou preocupada com a possibilidade de chocar o público, por saber que as pessoas não estão acostumadas a ver com naturalidade uma mulher mais velha viver tão livremente sua sexualidade. Mas não se arrependeu e comemora a quebra de alguns tabus
Tirando as tintas escrachadas da sitcom, a atriz sentiu na pele algo parecido com o que Copélia enfrenta no Jambalaya Ocean Drive. No início de sua relação com o professor de dança Álvaro Reis, 25 anos mais jovem, a atriz enfrentou a desconfiança da família. Mas Arlete não se encaixa exatamente nos padrões que a sociedade enxerga como ideais. Saiba o que uma das maiores atrizes do país tem a dizer sobre casamento, idade e preconceito:
Copélia
“Tive medo de aceitar o papel porque achei que ela poderia causar estranheza no público, por ser uma mulher muito livre sexualmente. Pensei: ‘Será que ela vai chocar, principalmente as pessoas de mais idade?’ Aí veio a surpresa: quem mais aceita a Copélia são as pessoas de meia-idade. E o gays, que são uma minoria oprimida”.
Preconceito
“Mesmo sendo uma sitcom, que é feita para divertir, ‘Toma lá, dá cá’ drena preconceitos. Isso me alegra. Os idosos sofrem muita discriminação. Há os padrões de comportamento estabelecidos pela sociedade, que é moderna, mas que oprime muito, principalmente a mulher. O homem não se submete tanto a esses padrões. Ele se casa de novo e tem filho com 80 anos…”.
Constrangimento
“No início, fiquei constrangida em falar algumas coisas, embora tenha o respaldo da comédia. E Copélia não diz grosserias. Mesmo assim, fiquei preocupada. Copélia é uma louca, transgressora. Só parei de me preocupar depois do terceiro episódio porque a reação foi positiva.”
Casamento
“Jamais pensei em me casar outra vez. E olha que já fui muito casadoira. Achava que o casamento era uma das melhores formas de ser feliz, que era bom chegar em casa e ter alguém me esperando. Acho que é, mas tem muita fantasia romântica. O casamento é quase incompatível com o sexo. Eu mesma não tive paciência com o casamento”.
Namorido
“Não somos casados, ele é meu namorido há sete anos. E, pela diferença de idade (Álvaro Reis, professor de dança, é 25 anos mais jovem), durante muito tempo escondi da família a minha relação. Temia a reação da minha mãe, dos meus filhos. Mas chegou uma hora que não deu mais. Mas sempre fui discreta. Hoje ele já freqüenta a minha casa. Minha mãe preferia que eu estivesse casada com um senhor, que tomasse conta de mim. Mas eu nunca tive alguém que tomasse conta de mim. Jamais fui cuidada, sempre cuidei. E outra: não quero um senhor. Sei o trabalho que dá cuidar de um idoso. E os senhores que ainda estão bem só querem saber das novinhas.”
Pior defeito
“Não posso me imaginar ao lado de uma pessoa mal-humorada. Acordo bem cedo e rezo, é meu melhor momento. Também tenho medos, claro, eu me preocupo com as limitações que a velhice traz, detesto a idéia de que um dia vou morrer, mas não é inteligente ficar me angustiando com a velhice, que está bem próxima, mas falo para ela: fica aí mais um pouquinho, fica.”
Figurino
“Copélia é exuberante, over. É claro que o Miguel (Falabella, um dos autores) pinta a Copélia com cores mais fortes. Evidente também que a gente não quer dar ao público um novo modelo da mulher de meia-idade, mas acho que agora olharão com mais naturalidade uma senhora se vestindo do jeito que ela quiser. E o que isso representa? Estou viva, meu corpo pulsa, não quero olhares escandalizados. Acho que é isso que o Miguel fala com essa personagem”.
Reconhecimento
“A gente vê atores que são reconhecidos apenas, entre aspas, como comediantes, e, de repente, eles têm a chance de pegar um papel dramático e ganhar prêmios. Sem dúvida, os atores que fazem drama, que ficam envolvidos com o teatro engajado, ou o clássico, são importantes. Para os ‘códigos da inteligência’, o ator se apresentar com um trabalho dito sério, fora da comédia, lhe dá um respaldo. Mas isso é uma ignorância porque a comédia é o gênero mais difícil de todos. Tem o tempo dela: é precisa, matemática, exata”.
Fonte: Agência O Clobo, 7/11/2007. Disponível Aqui