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A criatividade envelhece?

Queridos amigos,
Conheci uma artista plástica e educadora ano passado, a Maria Cininha, e conforme fomos nos conhecendo, ela me contou de sua dissertação de mestrado [em Gerontologia na PUC-SP] sobre criatividade e envelhecimento.

Tânia Sciacco/Consueloblog

 

Disse que na época tentou entrevistar alguns artistas renomados para conversar sobre o tema e não foi bem recebida, não compreenderam a proposta e alguns até se ofenderam: Como? Eu velho?! Mesmo com a decepção da negativa ela seguiu com o trabalho.

Pensei que seria um bom tema para trocarmos impressões aqui no blog. Este mês, o assunto da Vogue Casa também é sobre os criativos!!

Fiz uma mini entrevista com a Maria Cininha e escolhi algumas pessoas, com profissões e idades diferente para saber a opinião de cada um. Vamos lá:

Cininha como surgiu a ideia para sua dissertação?

Eu fiz minha dissertação de mestrado em um programa que muitos podem considerar improvável uma artista fazer: em gerontologia, a ciência que estuda o envelhecimento. A criatividade sempre foi um assunto que me interessou assim logo surgiram as perguntas; será que a criatividade é mais uma perda do envelhecimento? Será que um artista é menos criativo na velhice? A criatividade envelhece junto com o sujeito? Talvez fique a dúvida por que gerontologia? Foi meio por acaso, fui fazer um curso de extensão na PUC conheci o programa e me apaixonei pelo assunto, mesmo porque acabara de sair de uma faculdade na qual entrei com 46 anos e minha convivência com os jovens me fez pensar no envelhecimento que até então, ou passava despercebido ou negado.

Para você o que é criatividade?

A definição mais comum de criatividade: implica transformar ideias em soluções, perseguir o que acreditamos e transformar ambiente. Não resta dúvida que poderíamos ficar com esta definição. Mas, mais que isso a criatividade promove um sujeito a se situar no mundo como agente transformador, ao atribuir e extrair significados do mundo em que vive, fazendo escolhas com liberdade e discernimento, sendo influenciado, sim, pelas culturas, mas com atitude propositada e transformadora. Resumindo, a criatividade nos transforma em seres biográficos. Para mim criar sempre foi um fator de equilíbrio e um recurso mágico de energia. Sinto que nesta fase da vida criar passou a ser mais fluido e mais livre, educativo e permite o autoconhecimento. Posso dizer que é um complemento indispensável do cotidiano.

Como foi a reação das pessoas quando você as procurou para falar do tema?

Foi em 2004, quando comecei a minha pesquisa. Optei por escolher 3 artistas brasileiros com mais de 60 anos na época e que estavam em plena atividade artística. Dois deles me disseram não se interessar pelo tema e que não tinham tempo pra responder a pesquisa. Um terceiro o mais velho com cerca de 70 anos ficou furioso, me acusando de chamá-lo de velho. Falar de velhice ou do envelhecimento não é um assunto que as pessoas recebem com prazer, talvez seja por isso que nunca se rompe os estigmas da velhice. Não esperava isso de artistas. [ndr Foi a mesma conclusão que cheguei no meu artigo para a Bazaar sobre posar em lingerie aos 50. O post está AQUI]

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Hoje, você vai transformar a tese em livro, o que mudou? As pessoas mudaram?

É, resolvi agora transformar a pesquisa em um livro. Mas acho que nada mudou, ainda se atribui criatividade ao jovem e à criança, esquecendo que quanto mais se vive mais repertório se tem para criar…

E afinal, criatividade envelhece?

Se observarmos pela história da arte os artistas longevos são provas incontestáveis de que a velhice não rouba do ser humano a capacidade de pensar, de escolher, de decidir, de aprender e, sobretudo, a capacidade de se admirar, pois tudo isto está contido no ato de criar. Lógico que muitos tiveram restrições biológicas, o tempo alcança toda e qualquer coisa no mundo, até um papel que fica dentro de uma gaveta esquecido, fica amarelado pelo tempo. Mas nada impede que este papel amarelado possa ser recortado em formato de um sol e ser pendurado em uma janela. A criatividade não envelhece quando conservamos nosso “olho de menino” o olhar curioso, investigador, admirador, entusiasmado, espantado e apreciador.

Cininha criou as Marias quando tinha 53 anos. Pablo Picasso pintou a obra Guernica com 55 anos. Saramago ganhou o Nobel com 76 anos. Stanley Kubrick dirigiu seu último filme com 70 anos. Consuelo Blocker se tornou blogueira em tempo integral aos 46 anos.

O que eu, Tania, sinto: Eu com 48 anos de idade, acho que não envelheci na parte criativa, na verdade acredito que tenho melhorado e renovado a cada dia (assim como minha auto estima e minha modéstia, como vocês podem perceber). As minhas ideias, projetos, desejos, alegria nas descobertas, não seguiram o curso natural da vida, nascer, crescer e morrer, pelo contrário, quanto mais idade, mais repertório, mais ideias, mais lâmpadas do Professor Pardal!

Sobre Maria Cininha

Maria Cininha é artista plástica e arte educadora. Bacharel em artes plásticas pela Faculdade de Belas Artes de São Paulo e mestre em Gerontologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, onde desenvolveu a pesquisa que aborda a criatividade no envelhecimento, sob a orientação da Professora Elizabeth F. Mercadante. Nasceu e vive na cidade de São Paulo.

Hoje a artista desenvolve trabalhos em recorte e colagem, com criação de personagens, entre eles as Marias, figuras femininas lúdicas, que com suas formas inusitadas falam do cotidiano e do meio ambiente.

A faculdade de artes entrou em sua vida na maturidade. Foi durante o mestrado que se apaixonou definitivamente pelo recorte e colagem. Teve uma loja de bonecos e nesse período participou de uma exposição de presépios no MASP. O papel sempre foi seu suporte preferido, e com a colagem pesquisou a criatividade no envelhecimento, mais precisamente se a criatividade diminuía com passar do tempo, ou seja, se era mais uma perda do envelhecimento. Para esta pesquisa trabalhou com obras de velhos pintores que morreram com mais de 80 anos, um deles Henry Matisse, que frente às dificuldades de saúde, em vez de desistir e se conformar com sua incapacidade, se volta para os seus famosos recorte e colagem.

Nos primeiros trabalhos começou com releituras dos recortes de Matisse, entretanto buscando sua própria voz na técnica, procurando uma arte alegre, lúdica e colorida. Passou por varias fases: bichos, passarinhos, retratos, as Marias e outras que virão, mas sempre com o foco no lúdico. Dos oito anos no Flickr e nos dois anos no blog, oitenta por cento dos comentários referem que seu trabalho provoca sorrisos e encanta.

Participou de diversas exposições desde 1999, em lugares como na Escola Pan-americana de Arte de São Paulo, na Galeria Professor Vicenti di Grado – SP, na Biblioteca Alceu Amoroso Lima – SP, na Feira Mega Artesanal – SP, e no Café Flores na Varanda. Como ilustradora: ilustração para a Revista da ONG GOTA que foi lançada no São Paulo Fashion Week, em 2003; autoria e ilustração da Cartilha Direitos Humanos e Pessoa Idosa, desenvolvida junto a Secretaria Especial de Direitos Humanos, Esplanada dos Ministérios, Bloco T, em Brasília 2005; ilustrou o livro “As Aventuras do Meu avô” de autoria de Ângela Maria Quintieri lançado pela Editora Off Flip em 2012. Autoria e ilustração do livro: “Marias são Tantas” pela Editora Off Flip de 2013, entre outros diversos livros disponíveis no site issuu.com, com mais de 80 mil impressões no mundo. Em 2013 participou do projeto “Diário das 4 Estações”, da escritora Lunna Guedes, junto com esta e Raquel Stanick e Tatiana Kielberman, em que os livros diários foram publicados em agosto, com lançamento na Biblioteca Alceu Amoroso Lima – SP.

Matéria Postada no dia 24 de março/2014. Acesse Aqui 

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