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A Cooperação entre Gerações para a Sustentabilidade do Meio Ambiente

Podemos nos interrogar se os mais velhos podem se posicionar e atuar de modo incisivo como os jovens têm feito em relação ao meio ambiente.


As mudanças climáticas têm provocado sérias preocupações não apenas por parte dos especialistas, mas de todos os que tem olhos para ver. Não há como negarmos um desequilíbrio crescente no regime de chuvas com períodos mais rigorosos de seca e de tempestades, ocasionando muitas perdas humanas e materiais. A partir da Revolução Industrial no século XIX, a crescente emissão de gases tóxicos tem causado um preocupante aumento da poluição atmosférica, provocando o chamado efeito estufa com o consequente aquecimento do planeta.

Em decorrência do desmatamento de florestas e do uso demasiado e sem controle de combustíveis fósseis, como carvão e petróleo, assistimos a um acúmulo preocupante de dióxido de carbono, de metano e de outros poluentes na atmosfera. Esse processo de degradação do meio ambiente, que é igualmente acelerado pela destinação errônea de resíduos que poluem rios e oceanos comprometendo as reservas de água potável, coloca em risco a sobrevivência humana e também da fauna e da flora.

Desde a Conferência de Estocolmo em 1972 e a Rio 92, as conferências sobre o meio ambiente têm reunido lideranças mundiais em sucessivas tentativas de acordo visando conciliar o desenvolvimento econômico e a sustentabilidade ambiental. Mas, como temos acompanhado, as negociações avançam pouco, os governos resistem a mudar sua matriz energética para fontes renováveis, pressionados pela indústria poluidora. Participando desses grandes eventos, organizações não governamentais na defesa das populações mais vulneráveis, tentam pressionar os principais países poluidores.

Mas, outros atores sociais vêm se juntando às vozes dos que lutam por um planeta saudável. Esse novo protagonismo está sendo liderado por uma jovem sueca, Greta Thunberg, que aos 16 anos de idade passou a protestar solitariamente em frente ao Parlamento sueco, e paulatinamente foi chamando a atenção de todo o mundo. Graças a seu incansável ativismo, Greta tem recebido muitas homenagens e premiações, dentre as quais o título de personalidade do ano pela revista Time. Sob sua liderança, em pouco tempo, adolescentes de várias partes do mundo passaram a se mobilizar, realizando grandes manifestações em favor da preservação do meio ambiente e de um futuro saudável para eles, para seus filhos e netos, enfim para as gerações do futuro.

Ao refletirmos sobre a questão ambiental, podemos nos interrogar se os mais velhos podem se posicionar e atuar de modo incisivo como os jovens têm feito. Claro que sim. Lembremos que entre os mais velhos é possível encontrar muitos que se preocupam com o esgotamento de recursos naturais, seja porque já viveram suas infâncias em um mundo mais respirável, seja porque pensam no futuro de seus filhos e netos. Entre outros exemplos, ouvimos oportunos depoimentos de idosos que, na mocidade, praticavam natação ou canoagem na cidade de São Paulo, nas águas do rio Tietê, hoje altamente poluído.

Podemos, então, pensar na união de jovens e idosos na defesa do Meio Ambiente? Programas intergeracionais têm se multiplicado mundo afora com o objetivo de aproximar as gerações e promover o diálogo entre elas. Percebemos que outrora, a inserção do indivíduo em sua respectiva comunidade era mais sólida, situação que favorecia a convivência de jovens e velhos, hoje temos um quadro bem diferente. Por isso, tais programas visam reduzir o atual distanciamento geracional, favorecendo as trocas de experiências e a criação e o fortalecimento de vínculos afetivos.

Se essas iniciativas possuem o potencial para, a partir desse encontro, propiciar benefícios mútuos às gerações envolvidas nesse processo coeducativo, por que não as estimular a atuarem ombro a ombro em prol da comunidade, ou seja, em projetos sociais de insofismável relevância? Afinal, o que é bom para os jovens e velhos é obviamente bom para a sociedade como um todo. Nesse sentido, há experiências exitosas de ações intergeracionais que obtiveram sucesso no combate à violência de modo geral e contra idosos especificamente, ao tráfico de drogas, à gravidez na adolescência, à evasão escolar, e na promoção de iniciativas que buscam deter a degradação ambiental.

Nesse contexto, é mister ressaltar também o crescente protagonismo social e político dos idosos, mas não apenas em seu benefício próprio. Os velhos, além da defesa de seus direitos podem e devem defender a construção de um mundo mais saudável para as próximas gerações de jovens e de velhos. Dentre as condições facilitadoras para a integração intergeracional que elenquei a partir de observações e depoimentos, está a iniciativa dos adultos, afinal sua experiência de vida, supostamente deve lhe permitir perceber sua grande responsabilidade com as gerações futuras.

Foto: https://www.facebook.com/pg/apasc40anos/posts/

A motivação para esta breve reflexão que aqui faço se deve à leitura do livro “A Coeducação entre gerações para a Sustentabilidade” escrito pela professora Bel Dominguez, especialista em educação ambiental pela USP. A autora se baseou em pesquisa que realizou junto à população da cidade de São Carlos/SP, congregando grupos intergeracionais ligados ao curso de Gerontologia da Universidade Federal de São Carlos, a uma Unidade Básica de Saúde local e a residentes em um bairro desse município.

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Bel Dominguez adotou como referencial teórico a abordagem dialógica de Paulo Freire, contida, mais especificamente, nos livros “Pedagogia da Esperança” e “Pedagogia da Autonomia” em que esse grande mestre nos conclama a uma postura construída a partir de discussões com a comunidade, postura constituída de resistência e até mesmo de rebeldia a todas as formas de autoritarismo e exploração.

Nessa pesquisa, que foi ao mesmo tempo intervenção social, os diálogos entre as gerações aconteceram em diversas situações. Uma delas por meio de reflexão sobre as palavras-chave “Meio Ambiente”, “Cuidado”, “Saúde”, “Participação Comunitária” e “Consumo”. Outra atividade se deu no bojo de uma Feira de Saúde, organizada por uma UBS local, oportunidade em que se discutiu com moradores as condições socioambientais no território e seu impacto sobre a saúde coletiva, além das diversas formas de enfrentar esses problemas. Em outras etapas do projeto, oficinas, exposição de trabalhos, caminhadas em contato com a natureza envolveram crianças e idosos.

Iniciativas como essa nos deixam esperançosos. Mas, é preciso encarar os fatos. Vivemos um momento preocupante no Brasil em que as políticas de proteção ambiental têm sido sistematicamente desmontadas pelo Governo em favor do desmatamento e do garimpo ilegais, dentre tantas outras agressões aos nossos recursos naturais. Urge uma firme mobilização de brasileiros de todas as raças, credos e idades para que possamos reverter esse processo de destruição de nosso patrimônio ecológico. Vamos todos agir, velhos e jovens, enquanto é tempo.

Referência
DOMINGUEZ, Bel. A coeducação entre gerações para a sustentabilidade. São Carlos/SP. Mota Produções, 2021.

Foto destaque de Singkham/Pexels


José Carlos Ferrigno

Psicólogo, Mestre e Doutor em Psicologia Social pela Universidade de São Paulo. Especialista em Gerontologia pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia e pela Universidade de Barcelona. Especialista em Gestão de Programas Intergeracionais pela Universidade de Granada. Professor de cursos de especialização em Gerontologia. Consultor em planejamento, acompanhamento e avaliação de programas de preparação para a aposentadoria, de ocupação do tempo livre do trabalhador aposentado e de programas intergeracionais. Autor dos livros “Coeducação entre Gerações” e “Conflito e Cooperação entre Gerações”. Temas sobre os quais escreve: Relações intergeracionais na família, no trabalho e demais espaços sociais; Psicologia do envelhecimento; Preparação para a aposentadoria; Ocupação do tempo livre; Desenvolvimento cultural na velhice. E-mail: jcferrigno@gmail.com.

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